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O tormento com os cobradores da Intrum Justitia: "Há 10 anos a reclamar uma dívida falsa"

A empresa tem sido acusada de desrespeitar a Lei de Proteção de Dados, enquanto Vários consumidores relatam chamadas constantes e tons ameaçadores.

Juan Manuel Del Olmo

Uma pessoa afectada fala ao telefone com a Intrum / PEXELS

Intrum é uma companhia de serviços de gestão de crédito e ativos imobiliários. "Gerimos dívida", afirmam no seu site. Isso quer dizer que, quando as coisas se tornam feias para companhias que têm problemas com não pagamento e dívidas de utilizadores, tomam medidas. "Falamos todos os dias com mais de 250.000 pessoas em todo mundo para encontrar uma solução para a sua situação", afirmam no seu site. No entanto, o que eles qualificam de solução pode ser um verdadeiro inferno para alguns clientes de entidades que recebem chamadas da Intrum no limite da legalidade.

Um deles é Alejandro Castañeda. "Reclamam-me uma dívida falsa de há mais de 10 anos com a Vodafone", conta à Consumidor Global. Tudo começou quando quis aderir a uma oferta para novos membros, que pagariam indefinidamente metade da mensalidade. Quando Castañeda já se tinha inscrito, disseram-lhe que não podia ser. "Propus desvincular-me e depois ser inscrito como novo cliente, mas também não podia ser. Tinha que estar um ano sem o ser", relata. Desvinculou-se e ligou para a um número do atendimento ao cliente, de onde lhe pediram que devolvesse todos os aparelhos de telefone, televisão e internet.

Vodafone vende a dívida à Intrum

Castañeda explica que devolveu todos os dispositivos. "Há provas", recalça. No entanto, uma vez tramitada a baixa, passaram-lhe dois recibos que optou por devolver. Segundo explicaram-lhe mais tarde, para desvincular-se devia ter ligado para um segundo número de telefone, coisa que desconhecia, onde devia confirmar o fim da relação contratual. Acrescentaram também que devia pagar uma quantia pelo cabo de internet que tinha instalado em casa. Essa suposta dívida, conta Castañeda, foi vendida da Vodafone para a Intrum.

Uma mulher revê a sua dívida no computador / Imagem de senivpetro em FREEPIK - @Senivpetro

Então a Intrum começou com a matraca. Segundo relata Castañeda, há mais de 10 anos que lhe ligam para que pague. No entanto, a passagem do tempo retirou parte do calor da questão e deu a Castañeda uma dose de humor: "São como da família. Felicito-lhes no Natal ou na Semana Santa ou o que seja segundo a época, antes de desligar e os bloquear. Até dão-me pena os que ligam, muito mal devem andar para aceitar semelhante emprego", diz.

"Reclamam dívidas que estão vencidas"

Há outros afectados que não estão de bom humor para brincadeiras. "Ameaçam. São mal-educados e realmente eu não tenho nada com esta empresa.", afirma um devedor no fórum de avaliações Trustpilot. "Ameaçam, assediam e reclamam dívidas que estão vencidas, saldadas ou judicialmente liquidadas. Abutres permitidos pelo governo do dia", denuncia outro utilizador. Também há que sugira lacunas legais, já que a Intrum obtém os dados pessoais ao comprar dívidas a entidades como bancos, o que, na opinião de alguns, comprometeria a lei de proteção de dados.

De facto, existe uma resolução da Aepd de abril de 2016 na qual a entidade impõe à Intrum Justitia Debt Finance AG uma sanção consistente em multa de 50.000 euros pela infracção do artigo 29.4 da lei Protecção de Dados de Carácter Pessoal (LOPD). Este artigo estabelece: "Só poder-se-ão registar e ceder os dados de carácter pessoal que sejam decisivos para avaliar a solvabilidade financeira das pessoas em causa e que não estejam relacionados, quando adversos, com mais de seis anos, desde que correspondam verdadeiramente à situação actual das pessoas em causa".

Um homem atende uma chamada / PEXELS

Um contrato "malicioso"

Há uns anos, Marcos Ortiz presidia uma associação que geria junto com outros dois colegas. A entidade foi refundada com o objectivo de crescer, e abriram uma conta num conhecido banco. De acordo com a queixa, foram "enganados num contrato bastante malicioso, cheio de letras pequenas e cláusulas". Além disso, o banco tinha acordos com a Intrum, que, segundo a Ortiz, "compra-lhes dívidas a um preço baixo que depois reclamam de si".

Passado um tempo, o seu patrocinador começou a ter problemas. Deixaram de pagar o prometido, os pagamentos passaram a ser em mãos e na conta bancária não entrava nada. "Isso gerou uma série de comissões a favor do banco e de uma dívida que achamos que devia de ser de uns poucos euros no primeiro descoberto e chegou a mais de 10.000", narra este afectado.

Ameaças e lista de incumpridores

Durante esse processo, diz Ortiz, a Intrum esteve a ligar-lhe "umas 7 ou 8 vezes diárias de forma muito insistente, usando muitos números". Quando respondia "ameaçavam com julgamentos, embargos, listas de incumpridores... eles provavelmente não sabiam nem o que reclamavam nem porquê, tinham o nome da entidade e um telefone e simplesmente acossavam", descreve. Depois passaram a enviar cartas e Ortiz teve notícias do banco. "Foram mais pacientes e esperaram que a dívida disparasse para valores rentáveis para eles. No final fomos a julgamento", relata.

Uma pessoa abre uma carta / Freepik

Quando começou o processo, afirma este afectado, a Intrum diminuiu a sua intensidade e a sua insistencia. Assim, crê Ortiz, avisavam "de que ainda podíamos negociar com eles e poupar-mos o processo e despesas judiciais. Sempre a ameaçar". Finalmente, a primavera passada receberam uma sentença favorável que eliminava a dívida por completo, mas isso não significou o fim dos telefonemas. "Desde que o banco perdeu o caso, Intrum tem voltado ao assédio, não tanto, mas eles fazem chamadas semanais, que felizmente agora estão marcadas como spam", diz Ortiz.

Sequelas dos telefonemas constantes

Todo este processo deixou a sua impressão em Ortiz. "Durante algum tempo estive relutante em responder a números de telefone desconhecidos, fossem de quem fossem, agora antes de devolver um telefonema verifico o número nas redes, embora tenha perdido o respeito que me chegaram a gerar os da Intrum", reconhece. Define-os como uns "assediadores especializados" que lhe chegaram a causar "perturbações e crises de ansiedade todos os dias".

Também não é claro por que continuam a ligar. "Ou não se inteiraram da sentença ou simplesmente não têm escrúpulos", diz. Este meio contactou a Intrum para perguntar pelos seus métodos, mas, até ao termo desta reportagem, não obteve resposta.