Acontece todos os anos: termina o verão e é hora de dizer adeus aos longos jantares na esplanada, às sandálias… e aos banhos de sol. Com o passar dos dias, verifica-se com resignação como esse bronzeado que tão bem assentava vai desaparecendo. No entanto, cada vez alteram-se mais os processos naturais: fabrica-se neve artificial, come-se durante todo o ano fruta que antes era de temporada, e também as pessoas resistem a deixar de estar bronzeadas.
Esta resistência explica o auge dos soláriose que oferecem sessões de raios UVA. Em Espanha, a concorrência entre estas clínicas levou a que algumas estabeleçam preços muito baixos. Por menos de 6 euros, um cliente pode submeter-se a um banho de sol artificial durante 7 minutos. Alguns nomes são muito eloquentes: Solmanía, Sun Music, De sol a sol... A temporada alta tem lugar entre março e julho, com o repercussão em batismos, casamentos e comunhões. Trata-se, definitivamente, de um serviço padrão em Espanha. Mas que o seja não significa que não acarrete riscos. Riscos que estão pouco regulados e controlados pela administração.
Saudável ou perigoso?
360Clinics, uma empresa que conta com centros em sete comunidades autónomas, chega ao ponto de afirmar no seu site que "o bronzeado artificial, utilizado de forma controlada e segura, é uma verdadeira fonte de saúde".
No entanto, a opinião dos especialistas difere totalmente. Eduardo Nagore, chefe clínico do Serviço de Dermatología do Instituto Valenciano de Oncología, recorda que em 2009 a Organização Mundial da Saúde (OMS) afirmou que os raios UVA das cabines de bronzeamento eram cancerígenos.
Quadro jurídico demasiado fraco
Se as autoridades consideram que é uma prática prejudicial, está regulada? A coisa não está clara. Fontes do Ministério de Consumo afirmaram à Consumidor Global que a responsabilidade recae no Ministério da Saúde, onde, no entanto, não tinham notícia de que isto fosse assim.
A única regulação existente a nível de Espanha é o Real Decreto 1002/2002, de 27 de setembro, no qual se regula a venda e utilização de bronzeadores através radiações ultravioletas. Este marco legislativo obriga os centros de estética a colocar um grande cartaz que indique que os óculos são obrigatórios e que "as radiações ultravioletas podem provocar cancro da pele e danificar gravemente os olhos". Isto é: "você está prestes a receber emissões prejudiciais, siga em frente". Além disso, no rótulo deve ficar claro que certos medicamentos e cosméticos "podem provocar reações indesejáveis" e que o seu uso está proibido para menores de idade e desaconselhado em grávidas.
Responsabilidade individual
Além disso, a norma incentiva os estabelecimentos a oferecer várias recomendações aos seus clientes. Por exemplo, utilizar sempre óculos de proteção adequados, controlar os cosméticos ou aguardar 48 horas entre as duas primeiras sessões. Igualmente, sugere que o ideal é não se expor às radiações ultravioleta durante os períodos de tratamento com medicamentos e também não receber raios do sol e do aparelho no mesmo dia.
Por muito bem-intencionadas que sejam, estas recomendações são só isso. Não há forma de comprovar que o cliente as siga.
"A quantidade idónea de raios é 0"
Em todo o caso, os solários utilizam diferentes afirmações para captar clientes. Da Clínica San Lorenzo de Madrdi explicam que têm notado um aumento de utilizadores que vão ao seu estabelecimento aplicar raios porque têm déficit de vitamina D. O doutor Nagore reconhece que cerca de 20 ou 30% da população tem déficit desta vitamina, mas afirma que é um erro tratar de remediá-lo nessas cabines. Tal e como afirma, o estilo de vida que levamos é muito de interior, mas a melhor solução é a natureza: sol. A sobreexposição é sempre negativa. Segundo o médico, a quantidade idónea de raios em cabine para uma pessoa é 0.
Outro das afirmações que utilizam estas clínicas é o de assegurar que é saudável preparar a pele antes de ir à praia com uma sessão de raios. Mas Nagore responde que isto não tem fundamento científico. "O que é saudável é o natural. Tomar o sol pouco a pouco, para que a melanina responda progressivamente", explica.
Descontrole e excessos
Como em todos os setores, há diferentes graus de profissionalismo. Do centro de estética Top Sun & Beauty apontam que o sol é bom, mas há que o tomar com medida. O seu responsável considera que para além dos raios UVA, as pessoas abusam do sol. "Cada queimadura solar produz de tudo", admite. Um sol que, assinala, pode ser nocivo tanto por excesso como por carência.
Além disso, argumenta que há solários onde os controles e a revisão dos filtros sim são exhaustivos e o tempo está muito estipulado, o que garante a segurança. Segundo explica a empresária, o nível de controle é diferente segundo as comunidades. "Há clientes que se surpreendem quando lhes digo que têm de por os óculos ", relata. Agora, o centro não pode fazer nada para além de dar recomendações às pessoas "viciadas".
Invisibilização de um problema
Surpreende que, apesar ao consenso científico em torno dos efeitos negativos que podem produzir as cabines de bronzeamento, as autoridades não lhes prestem mais atenção. Segundo o médico Nagore, o Estado deveria considerar a implementação de uma regulação consistente. O galeno sublinha que o mais importante é a conscientização. "A grande maioria das pessoas que fuma sabe que fumar é mau. Estaria bem alertar de que isto também o é", insiste.
Por outro lado, pode-se examinar o tema de uma perspectiva social. Que a nossa é uma sociedade obcecada com o físico já o sabíamos, mas não deixa de ser curioso que, há séculos, o canône da beleza passasse por ter a pele branca. Neste sentido, Nagore afirma que seria útil deixar de idealizar o moreno. Parece que para o conseguir faria falta algo mais que um cartaz e umas quantas recomendações. O doutor avisa, além disso, que as consequências de tomar raios assiduamente em cabines são muito palpáveis no longo prazo: "As pessoas acabam com 45 anos e a pele envelhecida". É, conclui, "pão para hoje e fome para manhã".