Levantar da cama, lavar a cara e beber um café. São muitas as pessoas que, privadas deste ritual, não poderiam aguentar mais de 10 minutos em pé após uma noite de sono. O café, e em especial a dose matutina, converteu-se num símbolo cultural para os espanhóis, que consomem 4,5 quilos deste produto per capita a cada ano. No entanto, nem todas as chávena são iguais e entre moedores, cafeteiras italianas e cápsulas da Nespresso um clássico continua a animar as primeiras horas do dia: o café solúvel.
Esta variedade da bebida costuma ser mais barata e acessível que as suas versões moídas ou em grão, além de que facilita em grande parte a sua preparação. Só requer aquecer um pouco de leite, despejar o pó, misturar e, em apenas um minuto, obtém-se um café supostamente fresco que gosta mais do que parece, já que é um dos nichos de café que mais cresceram durante 2019, com um aumento de compra de 8%, segundo relatórios do setor. E apesar de que é difícil negar a sua comodidade, as suas propriedades como alimento ssão diminuídas pelos processos pelos quais passa.
De onde sai?
Afinal de contas, que é o café solúvel? Nas palavras de Kim Ossenblock, barista e escritor especializado na cultura do café, é um café normal feito com filtro. Uma vez que se tenha a infusão filtrada, toda a água é retirada e o que fica são os resíduos secos, fáceis de transportar e de armazenar. Quando hidratados novamente com um líquido quente, estes resíduos deixam o seu sabor sobre o leite ou água. Por isso, perde muitas propriedades durante o processo.
"Existem várias formas de converter o café em solúvel. A liofilização mantém melhor os sabores e aromas, mas requer uma grande indústria para levá-la a cabo", indica Ossenblock. Entre os principais problemas deste produto destaca-se o excesso de temperatura na torra, o uso de variedades torradas e o volume necessário de grãos. Para que às principais empresas produtoras lhes saia rentável fazer todo o processo, precisam de quantidades enormes deste fruto, o que faz com que se invista muito menos na qualidade.
Sabor e cheiro
Mesmo assim, estes processos não são o único motivo pelo qual as nuances deste tipo de bebida em pó são tão baixos quanto os seus sabores ou valores nutricionais. Também está implicada a qualidade dos grãos de café, dado que não se usam aqueles com melhores propriedades. Da Associação Fórum Café de Barcelona afirma que se costuma utilizar cafés mais económicos, da variedade Robusta, e este facto faz com que diminua o preço da matéria prima. Além dosso, costuma-se empregar grãos que não são bons, quebrados ou que não são adequados para a venda convencional, algo que também repercute no impacto final no consumidor.
Apesar de tudo, ainda existem muita pessoas que pode aceitar a perda da profundidade do café em troca de uma solução rápida para tomar uma chávena instantânea. Neste caso, a organização catalã recomenda alternativas como os nespressos ou as cápsulas, que conseguem equilibrar o produto final entre velocidade e sabor. Outra opção é estar atento a novas startups que estão a tentar hibridar a opção solúvel com os cafés de especialidade, ainda que continuem sendo projectos caros e de difícil manutenção.
A qualidade de um café
"O conceito que se tem do café agora é semelhante ao que ocorreu com o vinho há apenas duas ou três décadas. Descobriu-se que o produto tinha muitos mais segredos, que não importava a sua origem, a variedade da uva, o que era combinado e foi-lhe dado o valor que merecia". Com estas palavras, Fran Bernal, conselheiro delegado de Cafelab e mestre tostador, explica o porquê do interesse no café de especialidade. Graças às novas possibilidades que se oferecem oferecidas pelas empresas profissionalizadas dentro da indústria do café, os consumidores descobriram uma nova forma de desfrutar e de se relacionar com esta bebida.
O profissional também não demoniza os cafés solúveis, mas sim que os põe no seu lugar. "É comida preparada", justifica Bernal. É uma forma prática de consumir esta infusão, mas tal como ocorre com os pratos pré-cozinhados e a comida caseira, não são o mesmo em nenhum âmbito para além de terem um objectivo comum. O problema neste caso é que em Espanha, por história e cultura, sempre se associou o café a uma bebida negra, amarga e intensa, com uns grãos de baixa qualidade e torrados com açúcar. Desta forma, as grandes marcas procuram replicar estes sabores para que os clientes os associem com o café de toda a vida, quando deixam fde ora as verdadeiras nuances que uma chavena deveria ter.