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'Febre Matisse': por que todo o mundo apostam nas mesmas impressões

Os cartazes com linhas simples são uma tendência na decoração, mas a popularização de determinados artistas prejudica a originalidade

Juan Manuel Del Olmo

Impressões de Matisse disponíveis no AliExpress / AliExpress

Estão por todo o lado. No Instagram, em casas de influencers e em lojas supostamente modernas. Estão até em fcapas de almofadas da H&M. As impressões de Matisse são uma tendência na decoração que já se está a transformar em epidemia. Entre as razões do seu sucesso está o preço, claro, mas também a calma que transmitem essas formas simples, seja com os traços negros próximos do minimal ou com a sua estimulante explosão de cores.

A popularização revela que, na hora de decorar, o público em geral não inova muito e que a profundidade artística pode ser prejudicada. Dois especialistas analisam a febre Matisse para a Consumidor Global.

Um recurso fácil

Em 2009, uma tela de Matisse atingiu os 32 milhões de euros num leilão. Hoje, suas impressões custam menos de três euros na Amazon ou na Aliexpress. Precisamente para combater a exclusividade elitista que impera nalguns contextos artísticos, as impressões são uma boa forma de aproximar os quadros. No entanto, a sua atual popularização ameaça homogeneizar as casas. E isso é o contrário a mostrar personalidade. Ainda mais, esse estilo já não é algo só criativo, mas sim uma ferramenta de marketing. O desenhador freelance Jaime Sabaté afirma que as linhas simples deste estilo "converteram-se num recurso artístico fácil que utilizam muitas empresas para fabricar os seus produtos". Podemo-lo verificar em lojas como Kave Home e Desenio.

Obras de Matisse num museu / Flickr - Selena N. B. H

Cada vez há mais consciência para comprar produtos locais, sustentáveis ou diferenciados, mas não no terreno da decoração. Porque trazer uns prints da Ásia é barato, mas depois não é ecológico nem original. Sabaté fala de que no general há "poucas vontades de decorar uma casa em condições" e aponta fatores sociológicos: "Talvez porque ao vivermos todos numa casa arrendada somos um pouco nómadas e deixamos de ter a aspiração de criar um espaço onde colecionar o que gostamos e o fazer mais de nosso", sugere o desenhador.

"Gosto, carinho e sentido da estética"

Clara Carreira, diretora de projeto na plataforma Photential Art, explica à Consumidor Global que a reprodução em massa de artistas muito consagrados é uma forma útil de aproximar as obras a um público pouco habituado a ver arte, mas, por outro lado, é necessário que a reprodução se leve a cabo "sem apropriar da imagem de nenhum artista" e "com muito gosto, muito carinho e muito sentido da estética para não chegar em massa de uma forma que não é a adequada".

Como episódio comenta que a Bershka lançou uma coleção de roupa "baseada em quadros do Boticcelli ". Não é a única: a Pull&Bear lançou no ano passado calças e t-shirts com estampados de Mondrian e Kandinsky. Quanto a Matisse, Carreira especifica que tem umas formas e umas cores "esteticamente muito agradáveis", pelo que considera que a febre com o artista francês tem verdadeiro sentido. "É muito decorativo, não é preciso entender demasiado e resulta muito agradável", argumenta. Da mesma forma, a especialista sublinha que o ideal seria que as suas reproduções se guiassem por um duplo interesse: pedagógico e estético.

Cópias

Matisse é o grande copiado, mas determinados traços de Picasso também estão muito em voga. O fenómeno tem raízes mais profundas: na era da imagem, está a levar-se a cabo uma estetização do não artístico. Jaime Sabaté recomenda que, para criar um espaço com personalidade, cada pessoa projecte os seus gostos para fazer seu o espaço. "Se és um friki, enche a casa de cartazes de super-herois e figuritas de warhammer. Se gostas de viajar, pendura as tuas melhores fotos. Mas evita a todo o custo criar espaços impessoais com este tipo de linhas simples porque no final o que fazes é converter o teu lar num apartamento ou em algo parecido a um andar turístico", conclui o desenhador.

Em Espanha há muitos profissionais independentes que criam ilustrações perfeitas para decorar qualquer sala ou assoalhada. As suas obras são muito mais caras que o preço de uma impressão, mas comprá-las significa apostar em trabalho original. "Artistas como Matisse, no final, foram pessoas que tinham uma forma de se representar a si mesmos e à sua sociedade, de modo que a sua reprodução tem que ser cuidada, legal e não deve desvirtuar a obra", diz Carreira.