"Endesa tem obtido um resultado ordinário neto de 2.398 milhões de euros, o 26 % mais com respeito a 2021, graças principalmente ao bom comportamento do negócio do gás". Reconhecia-o a própria companhia num comunicado no que celebrava seus benefícios de 2022. Em mudança, para muitos consumidores, o gás tem sido e é um quebradero de cabeça.
É o caso da mãe de Laura Guirao, que tem o gás contratado com Endesa. A revendedora é Nedgia, que faz parte do grupo Naturgy (os consumidores não podem escolher livremente seu revendedor de gás, a diferença da comercializadora). No final de fevereiro de 2023 chegou-lhe uma factura de gás adicional de 2.073 euros correspondente ao período compreendido entre o 03/08/2022 e o 30/01/2023. Alarmados, decidiram devolver o recebo. Não era só um custo desproporcionado, sina que, por esse período, Endesa já tinha facturar o consumo com a leitura real.
Suposta manipulação do contador
"Chamei um montão de vezes, porque estávamos assustados. A cada vez diziam-me uma coisa diferente, mas em várias ocasiões disseram que no relatório que eles tinham punha que era uma possível manipulação do contador e que tinha que falar com Nedgia, que eles não podiam me dizer nada", recorda Guirao.
"Acusam a minha mãe de ter manipulado o contador de gás e por isso, além das facturas que já pagou, lhe cobram esse custo, que é seu consumo estimado mais um custo pela mudança de contador. Minha mãe tem 70 anos e por suposto não tem manipulado nenhum contador", defende.
Um incidente comum em casas vazias
Uma das pessoas de atenção ao cliente de Endesa com as que falou, recorda Guirao, lhe reconheceu que esse incidente se estava a repetir em muitas casas de pessoas maiores que viviam sozinhas ou em casas de povo que ficavam vazias durante grande parte do ano.
"Outra das operadoras chegou a me oferecer fraccionar o pagamento da factura, mas em nenhum caso me deram explicações claras nem consegui que justificassem o custo que tentavam cobrar", relata esta afectada.
"Um montão de reclamações" sem resposta
Endesa tentou carregar o custo várias vezes, mas era muito alto "e minha mãe não costuma ter tanto dinheiro em sua conta corrente", indica esta consumidora, que pôs "um montão de reclamações à companhia", das que não obteve resposta. Finalmente, numa cita on-line no escritório de atenção ao cliente, uma empregada da companhia lhe ajudou.
"Disse-me que devia solicitar uma verificação do contador no Ministério de Indústria porque em Endesa não me iam fazer nem caso. Chamei ao Ministério de Indústria e ali disseram-me que devia me dirigir a Indústria da Comunidade de Madri. Consegui o telefone, chamei e disseram-me que devia dirigir ao departamento do serviço técnico de gás e que só atendiam com cita prévia, mas não tinham citas", lamenta Guirao.
Ameaças de Lexer
Para ela foi uma situação "muito estresante" porque, ademais, recebeu os telefonemas da empresa de recobros Lexer "várias vezes ao dia, ameaçando com uma demanda e dizendo que teríamos que pagar a costa do julgamento mais interesses de demora, e que lhe dissesse a minha mãe que lhes chamasse urgentemente".
Finalmente, depois de muito insistir, conseguiu que um técnico de Indústria ("devi lhes dar pena", estima Guirao) lhe recomendasse que bloqueasse os telefonemas de Lexer. "Disse que minha reclamação estava em curso, mas que tinham centos de reclamações pelo mesmo motivo e que levavam muitíssimo atraso", acrescenta.
Mudança de companhia
Assim as coisas, não parecia um caso isolado. Guirao decidiu mover ficha. "Não tinha risco de corte de fornecimento porque várias pessoas a quem consultei sobre o tema me recomendaram mudar de companhia e é o que fiz, sobretudo quando vi que ademais não estavam a cobrar as tarifas lembradas por contrato, sina umas superiores", aponta.
A dia de hoje sua reclamação a Indústria segue sem resposta, mas a princípios de setembro chegou-lhe um e-mail de outra empresa de recobros. Segundo Guirao, os relatórios de Endesa seguem sustentando que sua mãe modificou o aparelho. "Põem uma foto do contador (já tirado de seu lugar) com um buraco embaixo", descreve. O parte de trabalho de Incatema SL tem data 30/01/23, "pelo que entendo que foi esse dia", estima Guirao.
Interrogantes no relatório
Mas o contador, expressa, encontrava-se precintado no momento em que o substituíram pela suposta manipulação. Ademais, Endesa, em ditos relatórios, acrescenta a modo de observação que "se verifica que realiza a leitura". Então, se há leitura real com um consumo já facturar, por que cobram por um estimado?
A empresa que efectuou a mudança é Incatema, que se define como "uma das empresas espanholas de referência no área de leitura de contadores de gás". Trabalham "para as mais importantes empresas revendedoras de gás natural". Em 2011 efectuaram um total de 6 milhões de leituras de contadores "atingindo níveis de efectividade muito altos".
Incatema, "um despropósito"
Mas, baixo o ponto de vista de Guirao, com sua mãe não foram em absoluto profissionais. "O parte que fez a pessoa que o mudou -e que não avisou a minha mãe para que pudesse estar presente- não está assinado por ninguém. É todo um despropósito, mas é muito dinheiro para alguém como ela. Tem chegado a ter ataques de ansiedade devido a isto, porque em minha casa sempre se pagaram as coisas e para ela é horrível se ver metida em algo assim. Estão a acusá-la de cometer um delito", relata afligida.
O verdadeiro é que as reseñas de Google, as opiniões sobre Incatema assustam. Há umas 270 valorações e a empresa tem uma pontuação de 1,5 estrelas sobre 5. "É complicado encontrar com uma empresa com uma gestão tão nefasta com uma incompetência tão flagrante. Após duas visitas programadas, (nas que ninguém apareceu) para realizar a revisão periódica das instalações de gás nas zonas comuns do edifício, me indicam que não querem saber nada e que fale com Nedgia. Dizem que são uma subcontrata e que só respondem ante eles. Ao ser uma segunda visita chegou-me uma carta de ameaça que se não estava em casa cobrar-se-me-ia o duplo do custo da revisão" indicava um utente.
"Não foram às revisões programadas"
Também há quem narram incidentes muito similares ao de Guirao. "Uma autêntica vergonha esta empresa. Subcontrata de Nedgia. No ano 2022 não foram às revisões programadas, tendo a caradura de indicar em seu documento que o cliente estava ausente. Com esse motivo, em novembro 2022 fecham-me o contador de gás, cinco dias mais tarde reabrem-mo a raiz de insistir repetidamente, dando uma anomalía a caldera na tomada de combustão que me gera uma factura de 200 euros a reapertura", criticava um afectado.
"Em junho de 2023, uma inspecção sem avisar e sem estar eu presente me indica em seu relatório que há anomalías na tomada de leitura e inclusive possível manipulação do contador. Coisa que é totalmente absurda, já que minhas facturas posteriores têm sido mais elevadas que as do ano anterior. Mudam-me o contador e tudo isto me gera uma factura de 1.500 euros. E hoje voltam-me a fechar o gás com motivo das anomalías da caldera, já resolvidas anteriormente e confirmadas por Nedgia. Este chiringuito que têm montado deveria desaparecer", acrescentava
"Não faz sentido que a responsabilizem a ela"
O contador da mãe de Guirao encontra-se no portal, num lugar ao que tem acesso qualquer, "pelo que não faz sentido que a responsabilizem a ela", indica. "Sempre têm fazer# questão de que dava igual se o tinha manipulado minha mãe ou quem; que segundo o contrato o utente é responsável do contador independentemente de onde se encontre", acrescenta. Uma das hipóteses que maneja Guirao é que este galimatías gera benefícios económicos às empresas colaboradoras, neste caso, Incatema, que obteria pluses por detectar supostas manipulações de contadores.
Seja como for, Endesa já arrasta alguma mancha em assuntos relacionados com contadores. Em 2019, um julgado de Madri condenou a Endesa Energia XXI SLU a devolver ao sócio de uma associação de consumidores o custo total de uma factura de 2.146 euros, mais os interesses e a costa. Ao igual que a Guirao, lhe tinham acusado de manipular seu contador de gás. Segundo entendeu o juiz, Endesa não tinha podido acreditar a manipulação do contador e, portanto, também não estava acreditada a quantidade cobrada ao utente. Isto é, que se não estava meridianamente claro que essa pessoa era a responsável, não podia lhe meter um cargo assim.
Clientes de Endesa absolvidos
Ademais, em março de 2023, um julgado de Terrassa absolveu a uma família de pagar uns 12.500 euros de luz "por uma suposta manipulação do contador". Tal e como recolhia O País, "Endesa lhes tinha girado uma refacturación sobre o período de tempo (algo mais de três anos) no que, supostamente, tinham pago de menos por estar trucado o medidor. Depois desta decisão judicial do passado mês de fevereiro, a companhia, que demandou aos supostos infractores, não só deixará de perceber dito custo com os interesses legais, sina que terá que pagar a costa do julgamento".
Guirao está disposta a que se faça justiça. "Eu tenho toda a documentação pronta por se ao final recebêssemos uma demanda, mas em nenhum caso vamos pagar por um consumo que não temos realizado", determina. "Minha mãe chegou a passar frio durante o inverno passado, por medo a gastar demasiado. É sangrante que agora tenha que pagar este custo que alguém se sacou da manga".
A resposta das empresas
A perguntas deste meio, Endesa lava-se as mãos. "A comercializadora (Endesa Energia) limita-se a transladar a reclamação à empresa revendedora e depois translada ao cliente a resposta desta", indicam.
Por sua vez, Nedgia arguye que, de acordo ao estabelecido na legislação vigente e seguindo as instruções da Direcção Geral de Indústria de Madri, "é a encarregada de identificar irregularidades e actua sempre segundo o procedimento estabelecido por lei", mas utilizam o mesmo verbo que Endesa: "a companhia limita-se a evidenciar que o contador não reflete o consumo realizado, e quem acredita se existe manipulação emitindo um relatório detalhado da operação que se envia ao comercializador é SCI (Serviços de Controle e Inspecção) como Organismo de Controle Autorizado (OCA)", afirmam.