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A Apple dá esperanças aos diabéticos com um relógio implausível de medição da glucose no sangue

A tecnológica trabalha desde há anos neste confidencial projecto, mas há razões para considerá-lo impossível pelos precedentes sem sucesso de outras empresas

Ana Carrasco González

A Apple está a trabalhar num smartwatch que mede a glucose no sangue / APPLE- EP

Apple tem um objectivo que pode ser equiparado à definição de milagre. Um cego que vê. Um paralítico que anda. Ou um mudo que fala. A tecnológica trabalha desde a época de Steve Jobs num projecto confidencial que começou a gerar esperança. Um relógio inteligente que mede a glucose no sangue sem a necessidade de receber uma picada.

"Há rumores sobre que a Apple por fim desenvolveu a tecnologia para medir a glucose com um Apple Watch. Só posso imaginar o genial que será para os que sofrem desta doença. Oxalá fosse verdade", diz Enrique Ochoa, a quem a sua mulher diagnosticaram-lhe diabetes gestacional durante a gravidez do seu segundo filho. No entanto, a priori, o invento da empresa é uma quimera.

Não é uma realidade (ainda)

Como a mulher de Enrique, em Espanha a diabetes afecta quase seis milhões de pessoas. Os dados recolhidos pelas pesquisas nacionais e européeas de saúde refletem uma taxa de 7,51 em cada 100 pessoas. Entre essas pessoas também está Margarita López que destaca à Consumidor Global que o relógio inteligente no qual está a trabalhar Apple "seria perfeito para os diabéticos com insulina que têm que se medir regularmente".

Um Apple Watch / PIXABAY

Actualmente, para controlar o açúcar, estão os glucómetros clássicos que medem a glucemia capilar numa gota de sangue obtido por picada de um dedo e os dispositivos de monitorização contínua de glucose que determinam a glucemia intersticial utilizando uma cánula localizada na derme. Mas, segundo a chefe de serviço de Endocrinología dos hospitais universitários HM Montepríncipe e HM Torrelodones, Pilar García, não é uma realidade (ainda) poder medir a glucose sem ter contacto com o sangue do paciente.

Diabetes sem picada

"A Apple não especifica na patente que o seu objectivo seja analisar o nível de glucose no sangue. Mas é evidente que essa é a sua intenção", diz García. "A conseguí-lo, a empresa contaria com um dispositivo capaz de controlar três variáveis de grande importância na saúde: atividade física, coração e glucose. Tudo isso desde a comodidade de um relógio que levamos sempre colocado", imagina a doutora.

Entre as especulações sobre esta tecnologia, fontes próximas ao projecto da empresa com sede em Cupertino (Estados Unidos) afirmam que se está a fazer um novo chip conhecido como fotónica de silício e um processo de medida denominado espectroscopia de absorção óptica. Este sistema emite através de um laser umas ondas de luz por debaixo da pele que são capazes de detetar a concentração de glucose e graças ao algoritmo que leva equipado pode determinar os níveis no sangue.

Uma missão quase impossível

A Apple, que está há mais de 12 anos a trabalhar neste projecto, considera que este sistema encontra-se numa etapa de prova de conceito. A empresa acha que a tecnologia é viável, mas deve reduzir a um tamanho mais prático. Isso sim, da Apple asseguram à Consumidor Global que "não fizeram nenhuma comunicação oficial sobre o assunto. O que há publicado são especulações".

Uma loja da Apple na qual é possível comprar o iPhone 13 / PIXABAY

Parece uma missão quase impossível. De facto, várias empresas emergentes, e algumas das empresas maiores do mundo, tentaram sem sucesso desenvolver um sistema de monitorização não invasivo. Em 2014, a Google anunciou planos para fabricar lentes de contacto inteligentes que pudessem medir a glucose no sangue através de lágrimas. Em 2018 abandonou o complexo projecto. "Além disso, a Apple ainda não publicou dados da sua exactidão em termos de MARD (ou universal performance standard for CGM systems). Falta muita informação e, por isso, que seja aprovado pela Administração de Alimentos e Medicamentos (FDA)", alerta García.

Tipos de diabetes

Existem três tipos de diabetes. A tipo 1 afeta entre 5 e 10% dos que padecem desta doença e devem receber insulina todos os dias para sobreviver. Com a diabetes tipo 2, que afecta 90 ou 95% das pessoas com diabetes, basta regular com a alimentação e estabelecer hábitos saudáveis. É um processo que evolui ao longo de muitos anos e geralmente se diagnostica nos adultos. É possível que não apresente sintomas, pelo que é importante realizar uma análise do nível de açúcar no sangue.

Por último, está a diabetes gestacional, que aparece em mulheres grávidas que nunca tiveram diabetes. Geralmente desaparece após o nascimento do bebé. No entanto, pode aumentar o risco de ter diabetes tipo 2 mais adiante, pelo que a paciente deverá continuar a medir regularmente o nível de glucose.

Controlar a diabetes

Para a diabetes tipo 1, o paciente deve injectar insulina porque so eu corpo já não produz esta hormona. Tem que fazê-lo várias vezes ao dia, inclusive com as refeições. Também se pode utilizar uma bomba de insulina, que administra pequenas doses constantemente durante todo o dia. A bomba usa-se fora do corpo num cinto ou num bolso ou carteira. Está ligada a um pequeno tubo de plástico e a uma agulha muito pequena que se insere debaixo da pele e permanece vários dias no seu lugar.

Medicamento para diabéticos / Pixabay

Há outras ferramentas como o medidor continuo de glucose, um dispositivo que permite monitorar a glucose no líquido intersticial de forma contínua mediante um sensor que se leva inserido no tecido subcutáneo. No entanto, o método mais utilizado para o autocontrole da diabetes são tiras reactivas de glucose, isto é, pequenos pedaços de plástico que dispõem num espaço os elementos reactivos necessários para que, uma vez entre em contacto com o sangue, reajam de forma que se possa determinar quimicamente a quantidade de glucose no sangue.

Com insulina e sem insulina

"Devemos diferenciar entre as pessoas com diabetes que administram insulina diariamente e as que não o precisam. Actualmente, as tiras-teste são subsidiadas para as pessoas que tomam insulina e nunca deixaram de a tomar", explica a doutora Pilar García. "Para as pessoas que seguem outro tipo de tratamento para a sua diabetes, não é tão imprescindível medir o nível de glucemia todos os dias, e é verdade que a compra de tiras de teste não está a ser facilitada para elas", reconhece.

As pessoas com diabetes tipo 2 ou com diabetes gestacional podem-na controlar com opções saudáveis de alimentação e fazendo mais actividade física. Mas, nalguns casos, também será necessário comprimidos e injeções de insulina. Além disso, com o tempo, épode ser necessário mais do que um medicamento. Mesmo que a insulina não seja utilizada, pode ser necessária em ocasiões especiais. A realidade (ainda) é que a picada para controlar a diabetes vai continuar e o Apple Watch para a medir é (ainda) uma ilusão.