A conexão entre a bebida e a propina é estreita e antiga. Não só porque depois de muito da primeira pudesse ter algo da segunda em tabernas remotas, sina porque pino, em grego, é um verbo que significa beber.
Unida ao prefixo προ- (pró, dantes), a palavra propino viria a expressar a ideia de oferecer bebida de forma generosa. Em latín, propinare confirma este laço semántico.
A propina sugerida
Pode que a propina nascesse do vinho e a generosidad, mas hoje parece um pagamento que, pouco a pouco, vai entrando no terreno do imposto: a princípios de janeiro, uma publicação na rede social X do crítico gastronómico Carlos Maribona impulsionou um debate sobre a obligatoriedad de deixar ou não este extra.
Maribona mostrava o ticket de um restaurante de Madri no que se especificava o preço e, a seguir, o custo total com a propina sugerida, que era de 8%. "Nunca tinha visto em Espanha", dizia. Alertava?
"Questão de tempo"
"Em Inglaterra já faz-se na maioria de grandes cidades. Questão de tempo que chegue aqui. Podes pedir não o pagar, ou que te mudem o %. Seria interessante saber, dessa percentagem, que realmente recebe o pessoal, e como se gere", respondia um internauta.
Outros se mostravam mais beligerantes ou surpresos e assinalavam que a propina nunca deveria se impor. Algum rebatia este costume estrangeiro com o muito espanhol refranero: "Ante o vício de pedir…". Não parece, no entanto, que essa vá ser a via que tomem os hosteleros que servem as viandas mais em boga nos lugares mais trendy: a cada vez são mais os estabelecimentos espanhóis que a pedem. Ou reclamam-na. Ou a exhortan.
Tendência crescente
Consumidor Global publicou em junho de 2023 um artigo no que Marc Serra, professor da Universidade Carlemany, estimava que em Espanha só o 11% da população deixa propina. Por sua vez, Pablo Díaz, professor dos estudos de Economia e Empresa da UOC e experiente em turismo, dizia na mencionada reportagem que, "com o aumento dos pagamentos com cartão, se termina importando o sistema americano".
Algo similar crê Manel Morillo, diretor de Operações da consultora de hotelaria ConGusto Consulting, quem explica a Consumidor Global que a inclusão da propina sugerida no ticket algo que se vai vendo em Espanha, especialmente em zonas muito turísticas, como determinados estabelecimentos da Costa Brava, Baleares, Canárias e algumas zonas de Levante.
Onde se faz
Não é uma questão de procurar culpadas, mas, ante o tuit de Maribona, alguns internautas não duvidaram em assinalar com o dedo: segundo apontaram alguns consumidores em X, estas práticas já têm chegado à Maruca do Passeio dA Castelhana, a Manero, a Pátio de Leões ou a Arzábal. Lugares bem. Lugares coincididos. "Esta cidade é muito canibal", dizia o próprio Iván Morais a Consumidor Global faz algumas semanas. E insaciable, caberia acrescentar.
A foto não estaria completa sem ter presente o salário atual dos teóricos beneficiários da medida: o salário médio de um camarero em Espanha ronda, segundo o software para hotelaria Qamarero, os 1.200 euros ao mês. JobToday sobe o dado: "Em média, um camarero em Espanha cobra entre 9 e 10 € por hora em 2025. Isto se traduz num salário semanal dentre 360 e 400 euros. Mensalmente, este rendimento pode chegar até os 1.600 euros".
Clientes estrangeiros
Morillo, que ademais é responsável pela robótica para hotelaria Conbot, argumenta que com o crescimento do pagamento em Visa, que é algo internacional e paralelo ao descenso do uso do efetivo, a muitos clientes lhes surge a dúvida de como deixar propina.
"Isto tem gerado esta sorte de petição para poder isolar uns movimentos de outros e que todo fique melhor documentado", expõe. Porque, durante anos, admite, tem existido "uma verdadeira escuridão no tema da gestão das propinas, e é verdadeiro que a nível contábil são difíceis de reportar".
Um gesto "voluntário"
A perguntas deste meio, desde a Associação de Hotelaria de Madri não eludem a questão e descrevem a propina como "um gesto voluntário do cliente para a pessoa que lhe atende no local, uma transacção direta entre ambos".
"Tanto a decisão de dá-la como a quantia desta é voluntária, pelo que não somos partidários de induzir ou sugerir custos que pudessem limitar esse grau de autonomia e discrecionalidad do cliente, que deveria ser total", opinam. Afinal de contas, as propinas premeiam não só a eficiência do camarero, sina também sua cordialidad e, por que não o dizer, sua elegancia ou subtileza à hora de actuar e propor provar uma ou outra coisa. E uma sugestão negro sobre alvo é de todo menos subtil.
"Casos concretos e isolados"
Não crêem nesta associação (dedicada a um sector capital para a economia da Comunidade) que seja algo que se esteja a generalizar em Madri, sina que se trata mais bem de "casos concretos e isolados que costumam se dar em estabelecimentos nos que a freguesia é internacional, com muitos clientes procedentes de países nos que esta prática é mais habitual e está inclusive regulada como parte do serviço".
"Nestes casos excepcionais que possam se ver em Madri, a inclusão poderia ser inclusive a petição desses clientes, que em seus países de origem têm uma referência clara dessa propina por estar regulada", agregam.
Rendimento sabroso
Por outro lado, diz Morillo, com os atuais problemas de pessoal e com a perda de poder adquisitivo, a muitos hosteleros surge-lhes a dúvida de como gerir este "rendimento tão sabroso para os camareros". E estas técnicas que vêm "de Estados Unidos ou de países do norte de Europa" se antojan efetivas. Ainda que sua assunção não vá ser imediata e gere certo atrito.
"Em alguns países, não dar propina é um sinal de muito má educação, de modo que sim, a especificar no ticket pode provocar que ao cliente espanhol lhe façam sentir uma verdadeira incomodidad", concede. A grandes rasgos, isto vai, crê, de "apertar um pouco ao cliente nacional, lhe pondo, em verdadeiro sentido, entre a espada e a parede, sobretudo em locais modernos ou mais de moda, esses chamados places to bê, onde, muitas vezes, se és nacional estás rodeado de turistas estrangeiros".
Até um 30% extra
Nestes casos, ao cliente (cliente-espectador-assistente) não ficar-lhe-á outra que passar pelo aro. Quanto aos frios números, o complemento de propina, segundo Morillo, pode chegar a estar acima do 15% do salário estabelecido.
"E, em lugares especialmente turísticos, como Ibiza, Formentera ou locais de noite de Madri, pode chegar ao 25-30%. Isto significa que uma pessoa que ganha 1.800 euros netos aproximadamente, se pode levar uns 250 de propina, facilmente, nos estabelecimentos mais trendy ou com muito punch".
Adaptação
O experiente de ConGusto acha que a inserção da sugestão de propina na conta pode comparar-se, salvando as distâncias, com o que passou com as caixas de cobrança automática nos supermercados.
Ao princípio causaram verdadeira rejeição, "mas quando já o viste 40 vezes em 40 lugares e entendes que é uma onda, mais ou menos o assumes. Isto demorará muito em se assentar, mas há determinadas marcas de restauração em Espanha que se podem permitir esse risco".
Influência do resto do mundo
Ademais, a hotelaria é um sector cambiante, instável e severo para muitos trabalhadores, mas permeable ao que ocorre no resto do mundo. E já há muitos cocineros e consumidores viajados aos que estas práticas não lhes chirrían.
"Nenhum menino espanhol que vá a um brunch a por um café de especialidad e um avocado toast se assusta se lhe põem no ticket o 10% de propina. Se cabreará, quiçá, se passa-lhe o mesmo na tasca de não sê quem com umas batatas bravas e um terço", crê Morillo.