Hoje estão em infinidad de restaurantes, mas faz uns anos consideravam-se um produto sem distinção, de andar por casa, ou inclusive rancio. Têm aparecido em Paquita Salas, mas dantes figuraram no Lazarillo de Tormes ou em textos de Calderón da Barca. E aí seguem, magistralmente ternos, invariavelmente estaladiços. Os torreznos não escapam do boom castizo que opera a vários níveis e atinge também a gastronomia. De facto, pode-se dizer que levam vários anos em auge.
Agora bem, como distinguir um bom torrezno de um mediocre? Que diferenças existem entre os que se servem em Madri e os que se produzem em Soria , a província que os leva por bandeira?
Marca de Garantia
Soria é a pátria do torrezno por direito. Juanjo Delgado, director técnico da Marca de Garantia 'Torrezno de Soria' conta a Consumidor Global que atingiram este selo em 2013 e, desde então, são os únicos que estão no mercado com ele. "Se o torrezno de Soria tem-a, é porque é único e exclusivo da província, e porque sua qualidade está assegurada", defende. Agora bem, Juanjo Delgado parte do facto de que torreznos "há muitos ao longo e largo de Espanha".
Neste sentido, a definição que a Real Academia Espanhola dá deste produto ("pedaço de tocino fritado ou para fritar") não se ajusta a como o preparam em Soria. "O torrezno de Soria distingue-se em primeiro lugar pela panceta, pela forma de cortá-la e adobarla, e pela mistura de texturas que tem: a corteza, doradita e estaladiça; e o magro, terno e jugoso". Nada que ver com as cortezas duras ou carbonizadas que se vendem em muitas zonas. Com tudo, Delgado reconhece que o torrezno está de moda e que do auge se beneficiam todos. Aponta, ademais, que uma comunidade autónoma tem limites definidos, mas uma receita não. Assim, nas províncias limítrofes de Soria (como Guadalajara) se elabora de forma similar. "Mas não igual", apostilla.
O preço quase duplicou-se
Em Madri é possível degustar uns torreznos em multidão de restaurantes , não só nos mais apegados à cozinha tradicional. Por exemplo, O Cinco de Tirso é um local que abriu faz dois anos em plena praça de Tirso de Molina que insufla ar fresco à ideia de taberna castiza. Aqui, a ración custa 6,5 euros. Em outros, como Casa Morteiro (alta cozinha de brasas e guisos) os torreznos sobem até os 10 euros, em Ponzano 12 se podem pedir por 12 euros e nos Galayos, um ícone localizado junto à Praça Maior, por uns 7 euros. Mas o restaurante madrileno mais señero quanto a torreznos chama-se precisamente assim, Os Torreznos. Fundou-o um abulense, José Luis Blázquez, quem em 1956 trouxe-se uma receita de seu povo. Na actualidade são três os estabelecimentos dos Torreznos que há em Madri.
Juanjo Delgado assinala que num bar de Soria, um torrezno (isto é, uma atira contundente, de uns 2 cm de largo) pode custar uns três euros. Menos da metade do que custa na capital. Não obstante, reconhece que "o preço quase se duplicou". "Levamos quatro ou cinco anos tendo que subir o preço e a gente protesta, mas tem sido necessário o subir porque o mercado chinês absorve o porco em fresco", explica. Para além dos altibajos das empresas cárnicas, os preços podem-se apalpar nos grandes supermercados. Por exemplo, em Carrefour pode-se comprar uma bandeja de torreznos prontos para fritar por 3,90 euros (da marca De Nossa Terra e 215 gramas de importância). Depois há cortezas fritadas que são, afinal de contas, snacks.
Intrusismo gastronómico
Com o aplauso unânime de chefs e comensales, entendidos e ignorantes, velhos e maiores; surgem as imitações. Juanjo Delgado assinala que quando um produto se põe de moda, as intrusiones e cópias são inevitáveis. Não critica o resto de torreznos que se servem em Espanha, senão os que dizem ser de Soria sem o ser. "Temos chegado a ver fotos que nos enviam, por exemplo, desde uma feira, nas que há umas cortezas que se anunciam como 'Torrezno ibério de Soria', e isso não existe. O torrezno não é ibério", relata com mais sorriso que enfado.
Soria não é a única cidade que presume de torreznos. Em Segovia (onde a parte dura predomina sobre a terna) se podem comprar em muitos locais, enquanto em Ávila, Zamora ou Salamanca é habitual os ver troceados nas 'batatas revolconas'. Segundo assinala Juanjo Delgado, o de Soria "ten-lo que fritar e comer no dia, não aguenta bem mais de 24 horas". Isso limita sua distribuição, mas assegura o sabor. Ainda com subidas de preço, imitações e um sector cárnico que se joga a partida de sua vida, este alimento é um desses platos nos que a gastronomia se volta o factor de identidade mais sólido. Juanjo considera, orgulhoso, que "quando alguém pensa em torreznos, pensa em Soria".