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Consumes cannabis? Assim afectar-te-á a futura lei que já debate o Congresso

Os partidos negociam uma iniciativa de Podemos para regular o cultivo, distribuição, venda, posse e consumo de produtos cannábicos, mas que não permitirá fumar maconha pela rua

Juan Manuel Del Olmo

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Algo cheira a verde em Espanha. Fazia tempo que o debate sobre o cannabis tinha trascendido os foros minoritários e agora, depois de muitos esforços por parte das associações, tem entrado ao Congresso. Unidas Podemos (UP) tem apresentado nesta semana sua lei de regulação integral e consumo do cannabis, uma norma que se soma aos outros dois textos propostos por Mais País (MP) e Esquerra Republicana (ERC). São alternativas diferentes, mas as três têm um mesmo espírito.

O documento da formação morada contempla a posse e o consumo de produtos cannábicos, bem como seu cultivo, distribuição e venda. Mais especificamente, o partido liderado por Ione Belarra propõe que se permita o consumo de 10 gramas ao dia, em privado e nos espaços habilitados. De modo que, não, por enquanto não poder-se-á fumar maconha pela rua. Ademais, esta legislação deixa fora os usos medicinales ou terapêuticos, já que em Podemos entendem que é Previdência quem deveria redigir uma lei específica que permitisse aliviar a dor de milhares de doentes crónicos. Assim as coisas, que perspectivas se abrem para os diferentes consumidores?

O papel cardinal das associações

Muitas das associações cannábicas cumprem uma triplo função: formativa, terapêutica e recreativa. Formativa porque muita gente vai a elas procurando respostas. Terapêutica porque em determinados casos são os próprios médicos os que sugerem a seus pacientes que provem com cannabinoides. Alguns membros destas associações preferem guardar silêncio. Quando se lhes pergunta, argumentam que já têm tido investigações e podem se meter em problemas. Quiçá estes problemas terminem em matéria de meses.

Beatriz Macho Barragués, advogada experiente em questões legais sobre o cannabis que tem colaborado com diversas entidades, considera que este grande esforço divulgativo e sanitário deveria recaer sobre o Estado. A letrada explica que, se finalmente se comercializa o cannabis, existe o risco de que as associações percam peso em favor das empresas. E considera que seria injusto, porque são as primeiras as que têm estado desde o princípio dando a batalha pela legalización e defendendo a planta. "Se faz-se uma regulação mercantilista, pode-se jogar por terra todo o trabalho associativo", alerta. Na mesma linha, Íñigo Errejón (MP) afirmou que o ideal seria fomentar o autocultivo para que os consumidores pudessem se beneficiar. De não ser assim, umas poucas empresas poderiam se repartir todo o pastel. "Há muitos investidores com a mirada posta em Espanha", adverte Macho Barragués.

Segurança e secretismo

A advogada considera que o ideal seria, em primeiro lugar, dar segurança jurídica às associações. Depois, sustenta, teria que entrar num período de transição para ver como se pode forjar a regulação sem prejudicar a ninguém. A partir daí, dar passos para adiante. Porque as entidades têm uma posição comprometida. Os responsáveis por Desván Madri, uma associação cannábica situada no bairro de Guindalera da capital, explicam a Consumidor Global que o 70% das pessoas que tocam a sua porta tem doenças graves, doenças crónicas ou padecimientos que não têm remetido com medicamentos legais. Faz pouco chegou a seu clube um exmilitar que se tinha rompido as costas durante uma operação. Segundo relatam, seu próprio médico tinha-lhe aconselhado procurar soluções cannabinoides e agora sua qualidade de vida tem melhorado relativamente. Às vezes, um pouco já é muito.

Apesar dos avanços, o cannabis segue estando mau visto. Essa percepção repercute directamente no dia a dia de muita gente. "Há pessoas maiores às que as soluções cannábicas lhes podem ajudar com suas doenças, mas não se atrevem a vir directamente à associação pelo que dirão. Às vezes é sua própria família a que lhes julga", relatam em Desván Madri.

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Dúvidas sobre os preços

Até agora, o vazio legal era flagrante. O autoconsumo não era legal, mas estava despenalizado. Em Desván Madri acham que os preços não mudarão demasiado nas associações. "Não fazemos isto pára lucrarnos", sublinham. Evidentemente, as empresas sim fá-lo-ão. Por sua vez, Beatriz Macho opina que o preço dependerá do imposto "que lhe queiram meter". É uma questão delicada: se o Governo acerta, o consumo legal poderia absorver o mercado negro. Mas se não o faz e se excede, as coisas não mudarão demasiado. O texto de UP especifica que o imposto variaria segundo a potência ou quantidade de THC de cada produto.

E o controle administrativo? A ideia em UP é criar um organismo, a Agência Espanhola de Controle da Regulação Integral do Cannabis (AECRIC), que outorgaria as licenças administrativas às empresas de cultivos. Tal e como recolhe o texto, as plantas não poder-se-iam cultivar no interior a não ser que o 90% da electricidade requerida fosse renovável ou limpa, sendo ademais a própria empresa a encarregada da gerar. Não é pouca coisa. Com o cannabis, UP pretende marcar-se vários tantos aunando sustentabilidade, luta contra a despoblación e criação de emprego através de benefícios fiscais que ajudem a impulsionar empresas cannábicas na "Espanha esvaziada". Não seria como se ir à Alcarria a fazer mel, mas poderia funcionar.

Frágil equilíbrio

"As associações têm parido o modelo, e a dia de hoje algumas continuam intervindas", afirma Macho Barragués. A situação é paradójica. Há pessoas que levam anos estudando e defendendo o cannabis que agora podem ficar atrás. A advogada pede que se conserte o dano que se lhes tem feito e denúncia que não se vigia quem o faz bem e quem o faz mau.

Sem um diálogo profundo com os grupos que mais sabem do tema, será difícil alumbrar uma lei justa que beneficie ao consumidor, reduza o impacto das máfias e "descongestione a justiça", tal e como pede MP. Ainda que primeiro há que ver que passa no Congresso. Cidadãos e PNV parecem estar a favor, de modo que, se o PSOE também lhes apoia, poder-se-ia armar uma maioria. Em Desván Madri acham que é questão de tempo. "Talvez não seja já, talvez não seja agora, mas será", concluem