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Morillas: "Um consumidor pode provocar uma crise reputacional a uma empresa em menos de um minuto"

O CEO da companhia, experiente na gestão de marca, explica como é a relação das empresas com seus clientes e qual é o papel que jogam os consumidores na actualidade

Ana Siles

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Microfone em mãos e a atenção dos assistentes. Mais que suficiente para que Marc Morillas, CEO da agência Morillas, se suba ao palco e comece sua conferência. Foi bem como começou sua participação no encontro organizado por É Design, a Escola Superior de Desenho de Barcelona. A companhia de branding conta com mais de 60 anos a suas costas.

Fundada por seu avô, esta empresa vai já por sua terceira geração com Marc Morillas à cabeça. A chave do sucesso? Ser um "ente líquido", tal e como afirma o próprio Morillas a Consumidor Global. Em sua conversa com Consumidor Global, o responsável detalha qual é o rumo que estão a adoptar as empresas com seus clientes. Um derrotero no que vem calcando forte a inteligência artificial, tal e como cabia esperar.

--Uma trajectória empresarial a mais de 60 anos e Prêmio Nacional de Inovação e de Desenho 2023, qual é a chave para manter no tempo?

--O sucesso é conseguir ter uma organização muito líquida, que sobretudo tenha capacidade de ler o contexto cultural no que se move e evoluir com ele. Se olha como nasceu a empresa da mão de meu avô nada tem que ver com as capacidades que minha geração tem tido que desenvolver. Morillas é um ente muito líquido que se vai adaptando ao mercado em função do que o mercado lhe vai pedindo sem sofrer.

--Como tem evoluído a comunicação das empresas desde então?

--Eu acho que o que tem mudado principalmente é que o consumidor ou o cliente se voltou bem mais exigente ao longo do tempo. A tecnologia veio-lhe dando mais poder ao longo dos anos. Nos anos 50, o cliente final tinha muito pouco poder. Por contra, em 2023, um consumidor pode lançar uma crítica através de uma rede social e provocar uma crise reputacional desde sua mão e em menos de um minuto.

Uma pessoa escreve sua crítica sobre um produto em redes sociais / FREEPIK

--Que lhe exige o consumidor a uma marca?

--Eu diria que transparência, honestidade e rapidez. É este terceiro ponto o que está a gerar mais problemas às marcas. Tudo tem que ser imediato e isso gera uma pressão muito difícil de gerir nas equipas das companhias. A individualidad do consumidor é mais importante. Dantes as empresas tratavam-nos em grupos, em cortes ou em segmentos. Hoje em dia, o consumidor já tem ferramentas para se fazer ouvir e pede um trato mais individualizado.

--Como se consegue esse trato individualizado?

–Sem dúvida, com a tecnologia. Isto só é possível graças ao avanço tecnológico. Se tu queres te ganhar a lealdade do cliente e queres ligar com ele ao máximo, suas preocupações para ele são o mais importante. A marca que mais as entenda, melhor se adapte a elas e demonstre que mais interesse tem na pessoa, eu acho que é a que se vai levar a vitória. A relação de marcas e pessoas vai acabar sendo de tu a tu praticamente.

--É aqui onde mais força cobra a inteligência artificial?

--Sem dúvida. Replicar milhões de processos em nanosegundos não é uma habilidade que tenhamos as pessoas e a inteligência artificial substitui-lo-á. Se há uma perfeita integração da inteligência humana com a artificial, poder-se-á dar esse paradigma de que as marcas se podem relacionar de tu a tu.

Um computador com ChatGPT / FREEPIK - @frimufilms

--Que dados precisam as marcas para chegar a esse vínculo?

--É evidente que quanto mais saiba do consumidor, mais poder-se-á adaptar a ele. Há duas formas de aproximá-lo. Para mim não é tanto que dados senão quantas perguntas. Isto é, como vai ser o diálogo entre a marca e o cliente final. Se há um diálogo, essa relação vai ser mais democrática. Se é um tema de que a máquina saca conclusões pelos dados que tu geras, a máquina então passa outra vez a estar por em cima teu.

--Compara em sua conferência o branding com uma religião, por que?

--Porque o que põe em xeque às marcas é a consistência. Se não aplicas e respeitas uma série de elementos, uma espécie de checklist , o que começarás a gerar é inconsistencia.

--Um exemplo?

--Para mim uma das marcas mais consistentes que existem são Nike e Rede Bull. Esta última leva dizendo que "Rede Bull te dá asas" desde faz praticamente 20 anos. Seus anúncios são iguais, seu tom é o mesmo. A gente que dirige sua marca tem muito claros os mandamientos, os pecados capitais não os cometem.

Logo de Nike / UNSPLASH

--Quem joga o papel de Deus?

--Para mim, o cliente. É quem faz o julgamento final. De facto, Mercadona, que o entende muito bem, a seu cliente o chama "o chefe". A opinião final sempre é muito dura.

--As empresas, de facto, não gerem nada bem as críticas

--Não, porque não têm a capacidade e porque ainda precisamos seguir avançando tecnologicamente. Quando um cliente critica algo é porque a marca tem traído um dos mandamientos. Bem seja porque não tem cumprido com uma promessa ou porque tem gerado umas expectativas às que não tem chegado.

--Então cumpre-se o lema de: o cliente sempre tem a razão?

--A ver… Para mim esse é um mau lema. Isto é, o cliente não sempre tem a razão mas sim é o que te acaba comprando. Por tanto, se queres sobreviver como negócio, é a única parte da equação que não podes matar.

--Que é o que impulsiona a uma marca?

--Eu acho que o que a impulsiona é entender muito bem o que procuram suas audiências e definir de uma forma muito proprietária. Nós quando saímos a comprar o que seja, sempre temos umas necessidades organizadas de uma maneira muito concreta. A marca que saiba o entender melhor e que saiba propor uma resposta a essa necessidade da forma mais diferente possível, é a que sempre vai por diante. Por exemplo, há multidão de marcas que têm lançado gafas de realidade virtual. Apple tem esperado 15 anos para lançá-las, mas quando o fez, as lançou como o faz Apple.

--E daí leva-as ao falhanço?

--O que mata às marcas é quando um só pensa em dinheiro. Se o que pensas é facturar e vender, é quando a promessa de marca se resquebraja e se volta praticamente pouco atraente ou inclusive onde o consumidor já nem a tem em conta.