0 comentários
Juan Baixeras (Audible): "Em 2020 poucas pessoas conheciam o audiolivro, mas o consumo duplicou"
A empresa da Amazon, que está perto de cumprir dois anos em Espanha, desenvolve ficções próprias e interpretações de autores consagrados
A literatura, por definição, é o conglomerado de histórias escritas. Mas algumas das maiores (a Odissea, por exemplo), vivem primeiro no etéreo, na tradição oral. É que escutar alguém contar bem uma boa história é algo que não passa de moda. Agora, é também um negócio em ascensão. Falamos disso com Juan Baixeras, Country Manager em Espanha da Audible, uma empresa da Amazon que se dedica ao audio-entretenimento. Segundo descreve Baixeras, "um audiolivro, geralmente, é uma adaptação fiel de um texto", enquanto um podcast pude ser "um festival". Na Audible há até 100 vozes, como uma superprodução de Hollywood levada ao áudio.
Este director conta entre risos que, quando vê a alguém com auscultadores na rua, tem a tentação de o parar e lhe perguntar o que está a escutar. Audible custa 9,99 euros por mês (o mesmo que o Spotify, mais que a opção mais barata do Netflix ), tem milhões de subscritores em todo mundo e dá serviço em 180 países. Curiosamente, Jeff Bezos também começou com a venda de livros, ainda que no formato físico. De algum modo, quando comprou a Audible em 2013, fechou um círculo.
-- A Audible oferece mais de 13.000 títulos em espanhol. Quais são os que têm mais sucesso?
--"Nos últimos dois meses, o número um é o de Ángel Martín, Por se as vozes voltam. Está a arrasar, também porque Ángel Martín é o narrador do audiolivro e porque o faz com muita energia e naturalidade. Também funciona muito bem Como fazer que passem coisas boas, de Marian Vermelhas. O terceiro seria O livro negro das horas, de Eva García Sáenz de Urturi. E, entre os históricos, está Harry Potter, narrado por Leonor Watling, que é um dos que sempre está no top. O bom que tem Harry Potter é que são sete audiolivros, de modo que quem o apanha tem muito percurso por diante. Leonor Watling esteve cinco meses no estudio gravando-o, tem sido o Everest do audiolivro".
-- Que importância tem a interpretação, isto é, a modulação da voz, num audiolivro?
--"É importantíssimo, e nem todos servem para o fazer. Não é porque és um actor que podes ser um narrador de audiolivros. Deves conhecer muito bem o texto ao qual te vais enfrentar e saber interpretá-lo. Entre os muitos que temos feito na Audible há coisas tão alucinantes como Moby Dick narrado por José María Pou, ou Juan Echanove, que fez Viagem ao Coração das trevas, de Conrad; ou Aitana Sánchez Gijón, com A Regenta. São actores que têm uma capacidade alucinante de transmitir a sua maestría ao mundo da interpretação de audiolivros, e fazem dessa leitura algo memorável que conduz o leitor e o prende".
-- A propósito da força do áudio, agora alguns criadores desenvolvem livros especificamente para ser lidos, para ser audiolivros. Isso continua a ser literatura?
--"Eu acho que sempre é literatura, a literatura está acima de tudo. Nós somos uma empresa que tem a capacidade de cotinuar a inventar coisas. Dentro desse mundo também estão as audio-dramatizações. Começamos com Lorenzo Silva a fazer duas audio-dramatizações da sua saga de Bevilacqua e Chamorro. Neste caso, é o próprio Lorenzo Silva que faz a audio-dramatização, que é herdeira da radionovela. Um audiolivro costuma ter uma duração entre 8 e 12 horas, enquanto uma audio-dramatização tem 4 horas divididas em capítulos de 30 minutos. É como um podcast no qual dás o poder aos autores".
-- Os barómetros do Ministério de Cultura assinalam que 5,2% da população espanhola escuta audiolivros. São números que estão na média da União Européia?
--"Acho que, em Espanha, a categoria do áudio entretenimento está nas suas fases iniciais. Somos uma empresa que foi fundada há 27 anos pela mão do seu fundador, Dom Katz, um jornalista que escrevia longos artigos na Esquire e além disso era runner. Ia correr com a sua casete, escutando audiolivros, e como corria tinha que lhe dar a volta. De modo que inventou um Mp3 e foi capaz de meter muitos audiolivros. Quando nós chegamos a Espanha em 2020, a análise que fizemos foi que muito poucas pessoas conheciam o audiolivro, não chegava a 2% da população. Hoje estamos em 5,2 %, de modo que cresceu mais do dobro. Isso significa que empresas como nós estamos a fazer bem o nosso trabalho, que consiste em criar uma indústria. Uma indústria que move dinheiro e dá dinheiro. E isso não o fazes sozinho, faz-se com as editoriais, com os estudios de gravação, com os narradores, com os roteiristas…".
-- Qual é o perfil do cliente da Audible?
--"O target é bastante homogéneo entre mulheres e homens. Por idade, 70% dos nossos clientes está entre os 25 e os 45 anos. Depois há uma categoria importante entre 18 e 25 que entra através do mundo do podcast. Nesta sociedade na qual competimos pelo tempo de tudo, os jovens lêem menos que há 20 anos, de modo que o podcast pode ser uma porta de entrada ao audiolivro porque descobres o que é uma história íntima".
-- Como é a relação com os editores? Não temem que possa representar uma ameaça para o seu negócio?
--"Acho que a audio-dramatização não canibaliza o livro. E os editores entendem que isto pode complementar o seu negócio. Elas vivem de editar o seu livro em capa dura, depois em bolso e depois o mundo do e-book. Há pessoas que querem ler em papel e também querem escutar um audiolivro, porque não têm tempo, ou porque querem escutar José Coroado narrar Drácula enquanto estão no Mercadona, a passear o cão ou no ginásio".
-- Chegou recentemente a Espanha uma importante empresa francesa de narração de histórias áudio. Como avalia isto, o mercado é mais competitivo?
--"Claro, e isso é o bom. Todos os mercados que são competitivos têm vários players, e se alguém quer vir aqui é porque viu potencial de desenvolvimento de mercado. É algo que nos convém muito bem. Nós aspiramos a ser um dos líderes do mercado".
-- O serviço da Audible custa 9.99 euros por mês. Afectou-vos a inflação?
--"Não, por enquanto não".
--Um livro para definir o momento actual da empresa.
--"Diria que A sombra de vento, de Ruiz Zafón. É uma história que conta uma viagem pelo mundo da literatura, da biblioteca, e que te ajuda a descobrir como as personagens, graças à literatura, sobrevivem. Isso reflete o que fez esta empresa: gerar um eco enorme no mundo da literatura".
Desbloquear para comentar