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J.M. Mulet: "Os que compram produtos de Heura pagam a soja a preço de chuletón"

O catedrático de biotecnología da Universidade Politécnica de Valencia desmonta os mitos sobre a mau chamada carne vegetal, um ultraprocesado caro e pouco sustentável

Teo Camino

José Miguel Mulet, catedrático de la Universidad Politécnica de Valencia CEDIDA

Os vegetais com aspecto de carne invadem os lineares dos supermercados. Next Level Meat e Vemondo (Lidl), Carrefour Veggie, e Tívall e Hacendado (Mercadona) são algumas das marcas brancas que produzem hamburguesas e salchichas veganas. Heura, Beyond Meat e NeWind Foods repartem-se o resto do pastel, mas seus preços não são para todos os bolsos. São saudáveis estas alternativas veganas à carne? Está justificado seu elevado preço? São produtos respeitosos com o medioambiente?

Para esclarecer estes e outros temas relacionados com a mau chamada carne vegetal, entrevistamos ao catedrático de biotecnología da Universidade Politécnica de Valencia José Miguel Mulet, autor dos livros Ecologismo real, Comer sem medo e Que é comer são?: As dúvidas, mitos e enganos mais estendidos sobre a alimentação, todos eles publicados por Edições Destino.

--As denominadas carnes 'plant-based' de Heura e Beyond Meat têm tomado os lineares dos supermercados…

--Em primeiro lugar, é equívoco chamar carne, entendendo que a carne é qualquer derivado de um animal, a estes produtos. Os alternativas vegetais à carne são um preparado a partir de matérias primas vegetais às que se pretende dar aspecto ou sabor de carne. Mas, desde um ponto de vista biológico, não são carne.

As hamburguesas veganas de Beyond Meat / AMAZON

--Estão justificados os altos preços de Heura ou Beyond Meat, que vendem seus hamburguesas a 4,99 e 5,95 euros os pacotes de 220 gramas?

--Está justificado porque para fazer que a farinha de garbanzos pareça carne tens que lhe meter uma barbaridad de ingredientes mediante um processo agressivo e complexo, e isso se paga. Se queres proteína vegetal de qualidade, faz-te uma salada com soja ou um plato de garbanzos. Quando queres o aspecto e a textura do que não é, toca pagar, e neste processo se perde o benefício ambiental que possa ter comer vegetais.

Um plato de garbanzos / FLICKR

--Contamina mais um bistec de ternera ou uma hamburguesa vegana?

--Sempre se diz que a produção cárnica tem mais impacto meio ambiental que o cultivo de vegetais, e é verdadeiro, mas, quando fazes carne vegetal, isso já não é um produto vegetal, isso é um ultraprocesado que requer de um tratamento agressivo para que pareça o que não é. Em resumo: o benefício ambiental destes produtos é nenhum.

--Mas se há empresários, como os fundadores de Heura, que se consideram, também, activistas…

--O que dizer-lhe-ia à gente que consome produtos de Heura, ou outras marcas similares, é que olhem a quanto lhes sai o quilo de soja, ou o de proteína vegetal, comparado com o que custa o quilo de soja sem processar ou sem forma de nuggets de frango. Compram soja a preço de chuletón.

--São um produto elitista?

--Sim. No fundo, é um dos principais problemas que temos com todos estes produtos. Têm que o fazer mais caro e impedem o acesso a gente com menos recursos. Passou algo parecido quando quiseram pôr uma dieta ecológica nas escolas --uma dieta que custava mais dois euros ao dia--, e claro, às famílias lhes supõe um problema. E sucede o mesmo com estes produtos de Heura, Beyond Meat e outras marcas.

--Que mitos existem sobre os alternativas vegetais à carne?

--Podes pensar que são um produto parecido à carne, quando não é assim. Podes pensar que têm uma qualidade e uma proporção de proteínas similar, quando não é assim. Ademais, a diferença da carne, estes vegetais carecem de vitamina B12.

--O etiquetado, às vezes, pode levar a confusão…

--São muito equívocos no etiquetaje. Heura, em ocasiões, utiliza o mesmo etiquetado para produtos vegetarianos e veganos, mas alguns deles levam proteína de ovo. Ademais, se consume-los porque apostas pelo bem-estar animal, não deveriam dizer algo sobre as condições nas que têm criado às gallinas? Se teu mercado é a gente que tem problemas éticos com o bem-estar animal, deverias facilitar esta informação. Se esconde-la…

--As gorduras poder-se-iam regular e fazer produtos realmente saudáveis, mas vários nutricionistas asseguram que, pelo geral, as hamburguesas de Heura e Beyond Meat têm muitos ingredientes, gorduras e também almidón, pelo que são um produto de consumo esporádico…

--O mais saudável, se a hamburguesa de Heura é de farinha de garbanzos, seria comer-te esses garbanzos de forma natural. Estes produtos ultraprocesados não têm nada de saudável. O importante, a base de qualquer dieta equilibrada, são as frutas e as verduras. A carne pode aparecer, ainda que tenha-lha demonizado de forma injustificada, porque tem uma proteína de alto valor. A dia de hoje, a maioria das alternativas à carne não são válidas.

A extensa lista de ingredientes das hamburguesas de Heura / AMAZON

--Em 2050 atingiremos os 10.000 milhões de habitantes no mundo, que comeremos então?

--Comeremos diferente porque a comida sempre evolui, mas, dado que em 10.000 anos não tem mudado muito a alimentação, a base seguirão sendo as raízes e as sementes. Nossos antepassados comiam trigo, batatas e milho, e, hoje em dia, seguem sendo a base da alimentação.