Carmen Rios leva mais de três décadas na Mayoral, a popular marca espanhola de moda infantil. Vinha de ser a responsável por retail durante anos e depois da compra das marcas Boston (homem) e Hug & Clau (mulher) em 2021 --cujos números não foram divulgados--, passou a ser a directora das novas marcas do grupo.
Para Rios ainda que, a priori, tudo são lojas de roupa, nada tem que ver a moda de criança com a de homem e a tendência que observa, com uma pandemia no meio, é que antes comprar roupa era por impulso e agora se raciocina mais.
--A Mayoral comprou a marca Boston em 2021, mas quanto tempo existe a marca em Espanha?
"Boston leva toda a vida em Espanha. É uma marca muito antiga dedicada à moda de homem. Antes, havia sobretudo, a alfaiataria. E a Mayoral já se levava há m tempo querendo entrar na moda de mulher e de homem. Então, pensou-se se era melhor lançar uma nova marca ou comprar uma empresa já existente. Mais especificamente, Boston foi comprada em junho e desde setembro começamos a trabalhar toda a equipa junta. A marca estava em Madrid e veio até Málaga. Agora o que queremos é fazer um reposicionamento da marca. Mudámos a oferta, as lojas, o conteúdo, a comunicação digital e até o logo. E também pusemos em marcha um plano de expansão. Além disso, vieram conosco dois sobrinhos do fundador para poder entender bem o negócio. A marca tinha 19 lojas e agora atingirá os 150 empregados e 30 lojas no final de ano, com 13 novas aberturas e dois encerramentos dos antigos espaços. O nosso objectivo é facturar 10 milhões de euros este ano. A maioria dos estabelecimentos estão em shoppings, mas a pé, na rua já temos uma loja em Málaga e outra na rua Alcalá de Madri".
--Porquê não há nenhuma loja da Boston em Barcelona?
"Há uma no shopping Baricentro, em Barberà do Vallès e há outra no outlet de Viladecans e já está. Neste ano não abrimos mais nenhuma na zona, mas no ano que vem vamos considerar a possibilidade de o fazer. Com as novas aberturas estamos a concentrar-nos em determinadas áreas agora mesmo".
--O centro comercial é mais atractivo do que a rua principal?
"Queremos ir para a rua também, mas há que procurar o local correcto, olhar bem o investimento, etc. Por isso, por enquanto, optamos por shoppings" .
Espera-se que Boston tenha lucros já neste ano?
"Ainda que a facturação do 2019 esteve em torno dos 8 milhões de euros, os números de vendas durante a pandemia caiu muitíssimo. Remontar isso com uma mudança de modelo tão brutal… requer de tempo. O que temos é um plano definido a três anos. Queremos ter 60 estabelecimentos em 2025 e ser rentáveis".
--Qual é o target da marca agora?
--"A Boston era uma marca muito tradicional na qual o traje tinha muito protagonismo. Mas chegou o Covid e sem eventos à vista sofreu bastante. Agora queremos vestir o homem de 30-35 anos. Para isso, fizeos um modelo de loja muito natural, onde o cliente se sente à vontade, as peças de vestuário se vêm bem e a roupa é muito funcional. Fizemos um padrão próprio para todas as peças e usado tecidos naturais. Não há um uso excessivo de logotipos e temos muito cuidado com a colecção e o meio na qual a vamos vender".
--E quanto ao preço?
"A relação qualidade-preço do grupo é muito boa. Temos uma boa relação qualidade-preço. Damos ao consumidor a maior qualidade possível pelo preço que ele paga. Não somos os mais baratos nem também não somos os mais caros. O desenho é muito fresco. Trabalha-se muito a cor e o fitting para que o homem se sinta cómodo. Antes o preço médio da roupa Boston era mais alto, mas agora a coleção é mais sport-casual e os preços ajustaram-se a isso. Mas em todo o caso são preços aessíveis a todos".
-- O consumidor agora compra mais roupa?
--"Voltou-se a um vestir mais relaxado. Tornáo-nos um pouco mais conscientes na hora de gastar dinheiro em roupa. Compramos o que gostamos e ao que vamos dar de uso a um preço razoável. Além disso, a sustentabilidade também se aprecia mais. Acho que antes a compra era por mais impulso e agora se raciocina um pouco mais".
--O talão médio é mais alto numa loja de roupa para adultos que na de crianças?
--"O talão é mais alto numa loja de adultos. No entanto, com os bebés o que passa é que às vezes se compra a mais e é um caso especial".
--A inflação também chegou às lojas de roupa do grupo?
--"Agora há um estudo muito profundo dos preços. Os preços de todas as matérias-primas que utilizamos –algodão e materiais naturais—sobem, mas estamos a estudar muito a peça e a colecção para tentar que os preços não subam. Achamos que o consumidor já nota a inflação noutros setores e por isso em alguns dos nossos produtos se se mexe o preço é em ligeiramente para cima, mas o objectivo é tentar conter os preços o máximo possível".
--É todo o produto da casa 'Made in Spain'?
--"As colecções são todas próprias e fazem-se em Málaga. Mas nem tudo é Made in Spain, mas sim uma parte pequena. Qualquer marca que faz milhões de peças, estas têm diferentes origens. Algumas coleções, são de proximidade, isto é, de países como Portugal ou Marrocos".
--Há problemas para receber tecidos ou produtos devido à guerra da Ucrânia ou a situação na China?
--"A Mayoral vende uma percentagem pequena em Espanha e o resto vende-o fora. Em empresas globais como esta, o que sim se procura é planificar o máximo possível e trabalhar muito on-line ou em remoto por videoconferência. A Mayoral tem empresas em origem, do grupo, em muitos países onde se fabrica e isso dá mais controle. Ainda assim, sofremos o contexto atual com atrasos. E tínhamos dois escritórios, um na Ucrânia e outro na Rússia, que foram afectadao pelo conflito bélico. Mayoral vendia bastante na Rússia. Era um mercado importante para o grupo. E agora está parado à espera de ver o que se passa".
--Boston só vende em Espanha? Há um plano de expansão internacional para a marca?
--"Por agora só vende em Espanha e, a curto prazo, será assim, mas não descartamos um salto internacional. Sairemos fora quando seguro, mas primeiro há que provar o novo modelo aqui".
Não há demasiada concorrência no sector da moda?
--"O setor têxtil é muito difícil, sobretudo se queres ser uma marca única, mas vender a muitas pessoas. Aí é onde há muita concorrência. Mas gostamos do que fazemos e por de isso decidimos dar o salto para a moda de homem e mulher".
--Que peso tem o negócio on-line para a Mayoral e as novas marcas?
--"Durante a pandemia, as vendas on-line subiram muito na Mayoral e continuam a crescer. As pessoas descobriram que podem comprar em qualquer lugar e pagar como quiserem e com muitas facilidades, como as devoluções. Mas no âmbito têxtil ainda alguns utilizadores preferem a loja física. Querem tocar a peça e provar-la no momento. Na Boston, estamos a começar com o on-line e fica-nos muito caminho por fazer. Mas acho que ambos os negócios –on-line e off-line– se complementam".
--Estão as lojas físicas em via de extinção ou isso nunca ocorrerá?
--"A nós com a Boston fica-nos muito por fazer e precisamos abrir lojas para fazer negócio e fazer marca. E em paralelo trabalhamos o canal digital. Mas não estamos a fazer aberturas indiscriminadamente. É um plano de expansão pensado. Se já tivéssemos 200 lojas abertas, saltaríamos a outros países ou faríamos outra estratégia, mas agora não estamos nesse ponto. Na Mayoral, no entanto, o ritmo das aberturas é diferente e mais centrado no estrangeiro. Mas, no general, no grupo há uma aposta clara pelo canal físico. Na minha opinião, acho que as pessoas não vão deixar de comprar na loja física e vão alternar ambos serviços. Por outro lado, o negócio digital não é a panaceia, precisa de um investimento, estudar muito o uso da página, que as condições sejam fáceis, uma boa qualidade fotográfica, ter uma tabela de medidas e não mentir. O negócio digital tem também muitas complicações, tal como a loja física".