Dizia o dramaturgo Arthur Miller que "o teatro não pode desaparecer porque é a única arte onde a humanidade se enfrenta a si mesma". A representação de obras cimeiras das tragicomedias espanholas que se desenvolveram entre o período que abarca o Renacimiento (século XVI) e o Barroco (século XVII) persistem em teatros que ainda conservam os vestígios de Félix Lope de Vega e de Miguel de Cervantes.
No entanto, incêndios cíclicos ou reconstruções que os converteram em meros pátios de vizinhos tem ocasionado que alguns importantes teatros do Século de Ouro se tenham apartado da arte, mas não do interesse colectivo. Os currais de comédias cautivan e sobrevivem a dia de hoje. Estes são os teatros mais antigos de Espanha.
O Teatro Espanhol (Madri)
Durante 440 anos o Teatro Espanhol de Madri tem desenvolvido sua actividade teatral, meta que o converte no mais antigo de Europa e do mundo com programação ininterrumpida. Desde suas origens no século XVI –denominado então curral do Príncipe – até agora, tem sobrevivido a incêndios, tentativas de derrubo, e tem experimentado numerosos projectos de transformação adaptando ao passo do tempo. No entanto, a capital tem sabido conceder ao teatro um lugar preponderante.
Sua localização no coração da cidade converteu-o em testemunha directa de grandes épocas históricas; não se pode obviar que no Século de Ouro espanhol concentrou em tempo e espaço a muitas das figuras artísticas mais ilustres de todos os tempos, e que muitos deles estrearam suas obras no palco do Teatro Espanhol. As entradas às diferentes obras programadas proximamente têm um preço que ronda os 20 euros.
O Corral do Coliseo (Sevilla)
Este antigo curral de comédias do século XVII converteu-se num curral de vizinhos e actualmente é um edifício de moradias particulares. Sua existência remonta-se ao ano 1612 quando Andrés de Claramonte, actor e dramaturgo espanhol, o dirigia. Em 1620 representou-se sua obra O grande rei dos desertos e o curral sofreu um grande incêndio. Até em seis ocasiões teve que se reconstruir este palco ao ar livre, pois sempre terminava por arder. Em 1675, um grupo de intelectuais sevillanos, entre os que se encontrava Miguel de Mañara, paralisou as funções porque consideravam que não eram do gosto de Deus. Uma vez que Mañara faleceu, as representações seguiram seu curso, ainda que não por muito tempo.
A partir do século XVIII transformou-se num curral de vizinhos e assim tem sobrevivido até a actualidade. O Corral do Coliseo é um apasionante viagem ao passado e constitui um dos teatros mais importantes do Século de Ouro. Pese a suas possibilidades, este emblemático lugar consagrado ao teatro não se conservou como o Corral de Comédias de Triana.
O Teatro Principal (Barcelona)
O Teatro Principal de Barcelona, antigo Teatro da Santa Cruz, é o mais antigo da cidade e um dos mais antigos de toda Espanha. Foi construído em 1579, graças a uma mordomia concedida por Felipe II ao Hospital da Santa Cruz. Ainda que as primeiras actuações tinham sido no recinto do hospital, com o sucesso conseguido, o novo teatro foi realizado em madeira como o Corral de Comédias e inaugurado em 1607. Em 1787, um incêndio destruiu-o por completo, e foi reconstruído com muita urgência ao ano seguinte.
Em 1840, mudou de nome, convertendo no Teatro Principal, já que naquela época estava a construir-se na Rambla do Centro, o Grande Teatro Liceo. Ainda que em 1933 sofreu outro incêndio e teve várias reconstruções. Fechou em 2006 e foi novamente aberto em 2013. Não obstante, fechou definitivamente em fevereiro de 2017. Segundo Crónica Global, a corrente hoteleira de José María Trenor anunciou que reabrir-se-á o costuro mais antigo de Barcelona como centro cultural
Corral de Comédias de Alcalá de Henares (Madri)
É um dos teatros mais antigos que se conservam em Europa. Encontra-se na localidade de Alcalá de Henares, em Madri. Está localizado na praça de Cervantes. Desde sua abertura ao público em 1602, seguiu um processo idêntico ao de outros teatros europeus da época, que foram adequando aos tempos com reformas estruturais conformes ao estilo dos espectáculos a exibir e aos usos sociais do público. A sua primeira etapa como Corral de Comédias, pertencem o pátio empedrado, as arquibancadas, aposentos, e a cazuela, isto é, o espaço destinado ao público feminino.
Ao princípio do século XX, com a revolução cinematográfica, instalou-se um ecrã de projecção para convertê-lo em cinema, e como tal manteve sua existência até os anos 70 de dito século. Abandonado durante várias décadas esteve a ponto de ser destruído, mas nos anos 80 começou, com financiamento institucional e rigorosa restauração que durou até o ano 2003, o Corral de Comédias voltou a resurgir em 2005. Actualmente tem recuperado sua programação teatral, e representar-se-á Enmudecer com falar, de Miguel de Cervantes, e A sensatez louca de Lady Macbeth, de William Shakespeare, entre outras, por um preço que ronda os 16 euros.
Corral de comédias em Almagro (Cidade Real)
O Corral de comédias em Almagro, em Cidade Real, foi declarado Monumento Nacional o 4 de março de 1955 e é o único exemplo de teatro do século XVII desta tipologia integralmente conservado, já que, na actualidade, segue mantendo a estrutura original dos currais de comédias do Século de Ouro. Foi construído em 1628 por Leonardo de Oviedo no pátio de um antigo mesón, motivo pelo qual seus elementos arquitectónicos respondem a sua dupla funcionalidade, como mesón e como teatro.
Restaura-se e reabilita como Corral de Comédias em 1954, reinaugurándose o 29 de maio desse mesmo ano com A Hidalga do Vale, de Pedro Calderón da Barca, e, ao ano seguinte, volta a actividade teatral com duas entremeses de Miguel de Cervantes, A guarda cuidadosa e O retablo das maravilhas. Desde este agosto até novembro representar-se-á A Celestina, atribuída a Fernando de Vermelhas (1499), e o citado Retablo da Maravilhas, um dos oito entremeses escritos por Miguel de Cervantes e Saavedra, por um preço que ronda os 20 euros.