Há quatro anos, o Brexit levantou uma barreira entre ambos lados do canal da Mancha, separando o Reino Unido mais que nunca do resto dos países da União Europeia. Agora, o governo britânico introduziu um novo obstáculo para os visitantes: uma permissão primeiramente eletrónica, conhecida como Autorização Eletrónica de Viagem (ETA, nas suas siglas em inglês), que será obrigatória a partir de 2025 e terá um custo de 10 libras, ou seja, entre 11 e 12 euros dependendo da taxa de câmbio atual. Uma vez preenchida, a permissão terá uma validade de seis meses.
O sistema funcionará de forma similar ao ESTA de Estados Unidos e estará disponível para solicitação a partir de março. A aprovação estará a cargo do Ministério do Interior britânico, que afirmou que o processo será simples e poderá ser feito online, ainda que o prazo oficial de resposta é de quatro dias. Para registar-se, precisar-se-á um passaporte biométrico válido, detalhes da viagem (como hotel ou lugar de residência e duração), uma direcção de correio eletrónico e um cartão de crédito ou débito. Segundo o governo britânico, a ETA fortalece a segurança e oferece um sistema de imigração digital "mais ágil, rápido e seguro" para os milhões de pessoas que ingressam no Reino Unido tdoos os anos. Não obstante, que é o que há por trás desta medida? Entrevistamos o CEO da Destinia, Ricardo Fernández, para conhecer em detalhe esta implementação.
--Qual é sua opinião sobre a futura implementação da Autorização Eletrónica de Viagem (ETA, nas suas siglas em inglês) para os turistas que visitem o Reino Unido a partir de abril de 2025?
--A partir de janeiro de 2025, todos os viajantes ao Reino Unido, incluindo europeus e não europeus, precisarão uma ETA, ainda que o processo de solicitação começará antes para os não europeus, ou seja, a 27 de novembro. E para os cidadãos da União Europeia, este processo estará disponível a partir de 5 de março de 2025. O objectivo principal desta medida é substituir a necessidade de um visto para entrar no país com uma permissão de 10 libras válido por seis meses. Ainda que se pretenda controlar o excesso de turistas, é provável que os mesmos viajantes continuem a visitar e simplesmente paguem um pouco mais. Não é de todo claro qual será o destino dos fundos arrecadados, mas essa é a postura que têm.
--Que informação tem até agora sobre os procedimentos específicos que deverão seguir os turistas para obter esta permissão?
--A solicitação da ETA pode realizar-se através da aplicação móvel UK ETA ou no site oficial do governo britânico GOV.UK. Segundo as autoridades britânicas será um processo rápido e simples, mas estou convencido de que durante os primeiros meses haverá um pouco de caos.
--Considera que o custo de 12 euros será razoável para os turistas?
--Chegámos a um ponto no qual, anos após a pandemia, o turismo entrou num ciclo expansivo e pouco sensível ao preço. Apesar do aumento significativo dos preços, os consumidores continuam a viajar. Houve uma grande inflação no preço médio por pessoa e noite em toda Europa, mas as pessoas continuam a viajar. Dez libras não é uma quantidade excessiva, especialmente considerando os preços médios de alojamento em Londres. Não acho que este custo adicional de 10 libras por viagem disuada ninguém de viajar; simplesmente pagar-se-á como um formalismo mais. Não tenho muito clara a justificativa desta medida, mas não acho que afecte significativamente o número de viajantes. É só um custo adicional que antes não existia e que agora há que pagar.
--Acha que o custo adicional da permissão disuadirá os viajantes de países que anteriormente não precisavam de visa para entrar no Reino Unido?
--Não acho que este custo adicional de 10 libras por viagem disuada ninguém de viajar; simplesmente pagar-se-á como um formalismo mais. Não tenho muito clara a justificativa desta medida, mas não acho que afecte significativamente o número de viajantes. É só um custo adicional que antes não existia e que agora há que pagar. De modo que é impossível que isto desincentive os viajantes, já que aqueles que precisam ua visa já estão acostumados aos custos e trâmites. Para o resto, não é um factor disuasório. No final, parece que o objectivo é arrecadar mais dinheiro dos viajantes. Com a quantidade de visitantes que recebe o Reino Unido todos os anos, 10 libras adicionais representam uma soma considerável.
--Tendo em conta o contexto pós-Brexit, acha que esta medida é uma extensão natural da tendência do Reino Unido de reforçar as suas fronteiras, ou vê outras motivações por trás da sua implementação?
--Segundo as autoridades britânicas, esta taxa servirá para controlar a fronteira e regular as entradas e saídas de cidadãos estrangeiros, fazendo o país mais seguro. No entanto, cobrar 10 libras por pessoa não terá um grande impacto. Os viajantes de negócios continuarão a viajar, e os turistas com um poder de compra razoável não ver-se-ão disuadidos. Quanto aos turistas com menos recursos, é provável que esta medida não afecte significativamente as suas decisões de viagem.
--A autorização permite múltiplas entradas ao Reino Unido para estadias de até 6 meses num período de 2 anos ou até que expire o passaporte do titular. Será também necessário obter esta autorização para estadias breves, como viagens de poucos dias, ou para conexões e escalas no Reino Unido para outros destinos?
--Sim, é necessário obter esta permissão para estadias curtas. Se fazes uma escala, também o vais precisar, porque uma vez que estás no aeroporto, podes sair ao abrir a porta. Tanto faz que em Estados Unidos.
--Que segmentos de viajantes acha que ver-se-ão mais impactados por esta nova regulação? Turismo, negócios, estudos, etc.
--O maior impacto sentir-se-á nos viajantes com menor poder de compra e nas famílias. Por exemplo, se são cinco na família, dez libras por pessoa somam cinquenta libras. Se paneiam uma viagem de fim de semana, essas cinquenta libras adicionais podem afectar o vosso orçamento.
--Que outros países implementaram medidas similares e como efetou isto ao fluxo turístico para esses destinos?
--A União Europeia vai implementar esta medida durante 2025. Igual que o de Estados Unidos é o ESTA, o de Reino Unidos é o ETA, o da UE será a ETIAS, que será obrigatório para os cidadãos de 60 países isentos de visa a partir de mediados do próximo ano. Esta permissão, com um custo de sete euros, permitirá aos viajantes realizar múltiplas entradas aos 30 países do espaço Schengen para estadias de curta duração. Foi uma das motivações de Reino Unido para começar a aplicar a medida.
--Afecta da mesma maneira esta medida num país que no outro?
--Afecta por igual. Isto lembra um pouco à época da pandemia do Covid-19, quando viajar requeria um exercício de sobrevivência, revendo numerosos lugares para cumprir com todos os requisitos. Antes, viajar era mais democrático, sem necessidade de mudar moeda nem passar por tantos trâmites. Agora, cada vez se complica mais com novos requisitos. O problema não é tanto o custo, que pode ser insignificante para alguns, mas para outros pode ser um ónus. No ano passado, o Reino Unido recebeu 30 milhões de viajantes. Se cada um paga 10 libras, isso soma 300 milhões de libras adicionais que o Reino Unido pode utilizar para a protecção das suas fronteiras e a promoção do destino. Ainda que não seja um incentivo acrescenta uma complexidade e mais um travão que os viajantes devem cumprir, o que não é ideal.
--Acha que a digitalização da permissão facilitará o processo ou poderia gerar complicações tecnológicas para certos grupos de viajantes?
--Para algumas pessoas, especialmente as séniores, isto acrescentará uma complexidade que antes não existia. Ademais, todo o que depende da tecnologia requer um período de adaptação. É provável que durante os primeiros meses haja notícias de caos nalgum aeroporto ou de sistemas que se caiam. Isto seguramente ocorrerá.
--Existem planos na Destinia para integrar o processo de obtenção desta permissão na sua plataforma de reservas?
--Não podemos obter esta permissão eletrónica em nome do viajante. O que tentaremos, sobretudo ao princípio, será comunicar este novo requerimento a todos os viajantes. Queremos assegurar-nos de que todos os que viajem para o Reino Unido estejam informados e não o esqueçam. Em muitos casos, não podemos discernir se o viajante é cidadão britânico no momento da reserva. Por exemplo, podes reservar um voo de Madrid para o Reino Unido, mas se não te pedimos o passaporte ou uma reserva de hotel, não sabemos se és cidadão britânico que vive em Espanha. Portanto, inicialmente informaremos a todos os viajantes e, com o tempo, refinaremos o nosso enfoque para ser mais específicos. É melhor informar a mais que nos ficar curtos em algum caso.