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Agilidade burocrática à custa de direitos? Como os formulários de reclamação estão a mudar
Andaluzia aprova um novo decreto no qual muda a regulação deste procedimento para a defesa do consumidor apenas três anos após o anterior
Em 2019 a Junta de Andaluzia aprovou um novo decreto sobre formulários de reclamação que posicionou esta comunidade como uma das mais avançadas em matéria de direitos do consumidor. Agora, só três anos depois, a regulação voltou a mudar e "poderia ser prejudicial para o consumidor porque conta com menos um método de prova", expõe à Consumidor Global a advogada Rocío Colás.
Seja qual for o negócio, conta com ela, ou pelo menos deve fazê-lo. O bar do canto, a loja onde se costuma fazer a compra semanal ou qualquer outro serviço onde uma empresa negoceia com um consumidor. Todos os comércios devem ter à disposição dos seus clientes os famosos formulários de reclamação.
Um modelo diferente para cada comunidade
Estes documentos que têm como objectivo solucionar possíveis conflitos entre consumidores e empresas têm uma regulação diferente segundo a comunidade autónoma que os tramite. No caso da Andaluzia, advogados, clientes e administração oncordam em que é uma das regiões com maiores garantias em matéria de direitos de consumo.
No entanto, a nova regulação dos documentos de queixas e reclamações que entrou em vigor este verão traz algumas novidades que poderiam representar um atraso em matéria de direitos face a 2019, segundo alguns cidadãos e advogados experientes.
Um relatório jurídico que "satura" a administração
E é que uma das principais novidades do decreto de faz três anos foi incluir a obrigação de emitir um relatório jurídico por parte da administração com "possível solução aos conflitos antes de ir a julgamento ou para modificar a atitude da empresa", explica Daniel Escalona, chefe do Serviço de Mediação, Reclamações e Arbitragem do Conselho Andaluz de Consumo.
Este documento jurídico, de carácter não vinculativo, considera-se uma garantia e mais um apoio para os queixosos. "Também não desaparece, simplesmente agora passa a ser voluntário por parte das administrações de consumo", assinala Escalona. Segundo explica o funcionário público, a obrigação de emitir estes relatórios jurídicos em todos os procedimentos "satura" a administração "porque nem todas as OMIC (Escritório Municipal de Informação ao Consumidor) contam com os recursos e assessores jurídicos necessários e se negavam a tramitar os relatórios".
Perda de direitos?
É por isso que, como explica Escalona, "muitas reclamações ficavam numa gaveta ao ser obrigatório o relatório e não poder o emitir. "Foram as próprias OMIC as que solicitaram a mudança do decreto para poder libertar a acumulação de petições", assinala o oficial.
"Se passa a ser voluntário, temo que não se vão tramitar mais relatórios", opina Jordi C., assessor jurídico perito em consumo. "Agora se vai ficar num procedimento que não contribui nada". Mas o verdadeiro é que é cedo para tirar conclusões sobre o novo decreto, "já que ficaria pendente de ver a sua aplicação prática", considera a advogada Rosana Pérez, vogal da Subcomisión sobre Direitos dos consumidores do Conselho Geral da Advocacia Espanhola (CGAE).
Mais agilidade e menos trâmites
"É verdade que, a priori, pode minar os direitos dos consumidores no sentido de que os priva de uma avaliação jurídica do conflito". No entanto, segundo considera a jurista, "com este novo decreto presta-se assessoramento jurídico por parte das OMIC", de forma que interpreta-se a substituição de uma garantia por outra.
Um dos principais objectivos deste novo decreto é "agilizar o processo administrativo e o simplificar", assinala Escalona, de Consumo Andaluzia. Mas, à custa de outros direitos? "É evidente que dá segurança jurídica que exista um relatório no sentido positivo para o consumidor", explica à Consumidor Global a advogada Rocío Colás, "mas se se trata de uma questão de economia processual, teria que ver como evolui a sua aplicação".
Um assessoramento "mais próximo"
Com este novo decreto também se pretende fomentar o papel dos telefonemas OMIC (Escritório Municipal de Informação ao Consumidor) e, por isso "a proximidade da administração aos consumidores para resolver os trâmites a partir de uma instância mais próxima", afirmam desde o Consumo.
Estas administrações passam a cumprir uma função de mediação e de serviço ao consumidor. "Se o assessoramento jurídico que se dá através das OMIC é adequado, não deve implicar uma redução de direitos", acrescenta a advogada e também professora da UOC, Rosana Pérez.
De 700 municípios andaluzes, menos de 200 têm OMIC
No entanto, ainda que a ideia de proximidade deste serviço seja boa, a verdadei é que muito poucos conselhos contam com este tipo de escritórios dedicados aos consumidores. "Todas as prefeituras têm a possibilidade de constituir uma OMIC e nós sempre o recomendamos, mas é verdade que aqui, de 700 municípios, não chegam a 200 os que têm este serviço", explica Escalona.
Neste caso, os consumidores que desejem tramitar estas queixas devem ir à delegação territorial competente de consumo da cada município, isto é, à da sua província. O assessor jurídico Jordi C., diz que "quando vais às OMIC não há pessoas que estejam licenciadas em Direito e isso deixa a desejar".
Formulários de reclamação electrónicos
No marco ae digitalização dos processos burocráticos, com esta nova regulação fomenta-se o uso dos formulários de queixas e reclamações em formato electrónico. Um documento que substituiria o típico papel impresso que devem ter os estabelecimentos. No entanto, a oferta de um código para tramitar as reclamações através de um móvel por parte dos estabelecimentos ainda não é obrigatória.
"Vamos dar um ano aos estabelecimentos para que se adaptem e garantam aos consumidores esta modalidade digital", assinala Escalona. Um prazo que alguns consumidores consideram "demasiado longo", enfatiza Jordi C. Assim é como muda o modelo andaluz de reclamações, referente à matéria de consumo para todas as regiões segundo os peritos. Por enquanto, não se esperam mudanças próximas nas regulações do resto das comunidades, mas, terá alguma réplica? perder-se-á alguma garantia? Será preciso atender à balança que equilibre agilidade democrática com direitos.
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