Viver em 750 centímetros quadrados. Hacinadas sem ver a luz exterior. Na escuridão. Rodeadas de um fedor insuportável. E claro, neste inferno, algumas colegas caem doentes. As mais débis, inclusive, pintam o solo de sangue e morrem. E à semana seguinte, outra mais. Assim, entre 5 e 12 anos. Toda a vida, enjauladas. Porque ainda há 9 grandes correntes de supermercados em Espanha que passam do bem-estar das gallinas que põem seus ovos.
A cada espanhol consome em media 220 ovos ao ano, segundo dados do Observatório do Consumo de Ovo em Espanha referentes a 2020, mas não todos os ovos são iguais. O que muitos consumidores desconhecem é que o sistema de jaulas para a produção de ovos na ganadería industrial "é um dos mais crueis e que mais sofrimento gera aos animais", expõe a este meio o cofundador da ONG Igualdade Animal, Javier Moreno. Uma opinião que compartilha a Autoridade Européia de Segurança Alimentar (EFSA), que adverte que este sistema de produção "não é seguro nem sustentável". Por isso, os principais retailers de Espanha já se comprometeram e têm uma política livre de jaulas ou tê-la-ão entre 2023 e 2025, "mas ainda há supermercados como Spar, Bon Àrea e Dinosol, entre outros, que estão a ficar atrás e não o fizeram", acrescenta Moreno.
Os súpers que passam do bem-estar das gallinas
Um dos casos mais surpreendentes é o da corrente holandesa Spar, que sim tem uma política livre de jaulas em oito países europeus, "mas não em Espanha", asseguram fontes do sector. Além da catalã Bon Àrea e a canaria Dinosol, há outros seis grandes supermercados que, até a data, não estão alinhados com a sensibilização dos consumidores, que a cada vez estão mais preocupados pelo bem-estar animal.
Gadis e Alimerka "também não comprometeram-se publicamente a deixar de vender ovos de gallinas enjauladas nem produtos que contêm ovo das mesmas", denuncia a directora de campanhas da ONG Equalia, Julia Elizalde. Com o Grupo MAS e o Grupo HD Covalco (Coaliment) "sucede mais do mesmo", aponta Moreno. Estas quatro correntes de supermercados estão sócias ao Grupo IFA, que supera os 33.000 milhões de euros de facturação. Completam esta lista negra GM Food (SOMA e PROXIM) e a cooperativa de supermercados Covirán, que conta com mais de 2.000 estabelecimentos associados em Espanha, recordam desde Igualdade Animal.
O caminho a seguir
Faz mal 5 anos, em 2017, um 93 % das gallinas espanholas viviam enjauladas. A dia de hoje, "essa percentagem tem baixado até um 73 % graças aos compromissos dos principais supermercados de Espanha", explica o cofundador de Igualdade Animal.
Segundo ele, a tendência para sistemas alternativos às jaulas é "imparable", tal e como reconhece a própria indústria do ovo. No entanto, ainda fica muito caminho por percorrer, pelo que "vamos seguir impulsionando esta mudança até que as jaulas façam parte do passado", acrescenta Moreno.
Os comprometidos
Em matéria de ovos livres de jaulas, as correntes alemãs Lidl (2018) e Aldi (2019), junto a Condis (2019) e AhorraMas (2018), são as únicas quatro grandes superfícies da distribuição alimentar em Espanha que, a dia de hoje, já não vendem este produto.
Por sua vez, Mercadona comprometeu-se a deixar de vendê-los em 2023, Eroski fará o próprio em 2024, enquanto O Corte Inglês, Carrefour, Grupo Dia e Alcampo comprometeram-se a deixar de comercializar ovos de gallinas enjauladas em 2025.
A postura de Spar, Bon Àrea, Dinosol e companhia
Ao perguntar aos 9 supermercados por que ainda não se comprometeram publicamente em deixar de vender ovos de gallinas enjauladas, desde Spar têm optado por atirar bolas fora. A multinacional holandesa destaca que "não conta com ovos de gallinas enjauladas entre seus produtos de marca própria". Inclusive asseguram que lhes consta que seus sócios e franquiciados "já têm apostado por oferecer ovos de gallinas livres de jaulas". No entanto, tal e como tem podido comprovar Consumidor Global, a maioria dos ovos que oferecem nos estabelecimentos Spar vão marcados com um '3', um dígito que indica que procedem de gallinas enjauladas sem mal espaço para se mover. Mais especificamente, das marcas Liderou e Dolsusi.
Bon Àrea, GM Food e Covirán também têm sido interpelados ao respeito por este meio, mas têm optado por guardar silêncio. O mesmo tem sucedido com as 4 das 5 correntes de supermercados associadas ao Grupo IFA --Alimerka, HD Covalco, Grupo MAS e Gadis--. O único que tem querido responder tem sido Dinosol, ainda que, ao igual que Spar, o fez com evasivas. "Desde a empresa estamos a trabalhar num plano de acções que iremos comunicando em função das decisões adoptadas pela companhia", expõem. Umas palavras que lhas leva o vento e que confirmam que, por agora, seguem sem comprometer com o assunto. As gallinas enjauladas têm nos dias contados, mas algumas empresas ainda se empenham em nadar a contracorrente.