No mundo dos ténis, a histórica rivalidade entre a Nike e a Adidas é bem conhecida. Mas para além dessa batalha de titãs, novas frentes estão abrindo caminho em cenários menos glamourosos, ainda que com muita atração entre os consumidores. Um deles é o dos supermercados. Ainda que não o pareça, 25% das vendas de moda são feitas no setor retail, conforme refletem os últimos dados da Associação Empresarial do Comércio Têxtil, Complementos e Pele (Acotex) e correspondentes a 2019. Na verdade, o seu avanço nas duas últimas décadas é tão grande que em 1993 só representava 7,3%. "As pessoas não sabem disso, mas há supermercados e hipermercados que exploram muito bem o setor têxtil", afirma à Consumidor Global Eduardo Zamácola, presidente da Acotex.
Por isso, o calçado desportivo low cost é um nicho de mercado suculento. E ainda mais nestes momentos. Por um lado, a economia de muitas famílias espanholas não atravessa o seu melhor momento devido à pandemia e, pelo outro, a roupa informal está em ascensão. "O subsetor do calçado desportivo é um dos que está a funcionar melhor neste momento. Com a mobilidade limitada e as poucas coisas que se podem fazer, muitos preferem vestir de forma cómoda e casual", explica Zamácola. Esta conjunção de fatores encaixa na perfeção com a estratégia que estão a desenvolver as redes alemãs Aldi e Lidl, que lutam uma batalha para reinar na categoria do calçado desportivo barato.
Como tornar exclusivo um produto que não o é?
Neste contexto, o Aldi lança hoje ao mercado uns ténis por 15 euros e a sua principal aposta é a sustentabilidade dos materiais utilizados. Segundo afirma a empresa, as unidades que estarão à venda são limitadas, ainda que não revelem a quantidade de pares que estarão à disposição dos clientes. Isto faz parte da estratégia de marketing na que se apoia a marca para gerar expetativa. "O consumidor gosta dos produtos exclusivos e que nem todos consigam ter. A estratégia neste caso não é vender milhares de unidades, mas sim alimentar a própria marca com um valor diferencial, ainda que só seja por uns dias limitados", considera Carlos Domínguez, diretor da consultora especializada em retalho MHE.
Na verdade, o Aldi procura replicar uma estratégia semelhante à que utilizou o Lidl no final do ano passado em Espanha e que funcionou na perfeição. Lançou uns ténis baseados nas cores corporativas da companhia e conseguiu que se convertessem numa espécie de objeto de culto. O sucesso foi tão grande que, além de se esgotar numas poucas horas, pares que na loja custavam 20 euros chegaram a revender-se por várias centenas de euros. "Utilizam roupa ou calçado de consumo em massa para oferecê-lo a preços muito baixos e isso permite-lhes fazer uma publicidade que é amplifiada ou que viraliza nas redes sociais quando o produto tem alguma característica diferencial", explica por sua vez Magdalena Espuga, CEO da consultora Kiss Retail. Com isto, consegue dar aquela aura de exclusividade a um produto que não deixa de ser uns ténis de baixo custo de supermercado. "Faz parte da genialidade destas empresas na hora de comunicar. Conseguem que as pessoas considerem que estão a comprar algo especial quando na verdade não é assim", diz Zamácola.
Aproveitar a atração para aumentar outras vendas
A consequência de toda essa expetativa gerada é um auemnto de outro tipo de vendas nos estabelecimentos. Segundo os especialistas consultados nas suas estimativas, a margem por unidade que se consegue com este calçado barato é bastante pequena. No entanto, os benefícios aparecem por outro lado. Aproveitam a alta frequência de visitas ao supermercado que este tipo de ofertas geram para incitar aos clientes a adquirir "produtos de médio porte e margens mais altas que os alimentos. Assim conseguem aumentar a despesa média do consumidor e a faturação de forma significativa", afirma Espuga.
Esta forma de captar o interesse do público de forma massiva é algo que os grandes supermercados "não podem conseguir com espargos ou leite", exemplifica Domínguez, que considera que este tipo de campanhas só vais mais longe.
As outras redes ainda não exploram este setor
Enquanto o Aldi e o Lidl têm conseguido atrair o público através dos ténis --entre outros produtos, como os robôs de cozinha , por exemplo--, a verdade é que não são as únicas que exploram o setor da moda. Nesse sentido, Zamácola considera que nos hipermercados como Carrefour se "vende têxtil de boa qualidade e a muito bom preço, além de um calçado que faz concorrência com as lojas tradicionais ou especializadas". Embora no caso da rede assinalada sejam vendidas marcas de outras empresas. Da mesma forma, outra companhia que também se destacou nesta categoria é a Alcampo. Na verdade, serve de exemplo que o atual candidato à presidência da Comunidade de Madrid e líder do Podemos, Pablo Iglesias, afirmou há anos que comprava as camisas nesta rede.
Do outro lado da moeda encontram-se estabelecimentos como a Mercadona ou o Dia. Como explica Dominguez --da consultora MHE-- estas empresas são mais conservadoras com o seu catálogo de produtos e a sua aposta centra-se nas necessidades mais básicas dos consumidores. No entanto, aponta que o Dia tem feito algumas tentativas nesta linha, embora sem muito sucesso. Por outro lado, este especialista também destaca que a roupa de supermercado costuma ter mais sucesso entre os homens que entre as mulheres. Ainda assim, detalha que as peças mais procuradas são as da parte superior do corpo, como t-shirts e tops. Por outro lado, artigos como calças geram mais reservas entre os consumidores devido à impossibilidade de os experimentar e ver como ficam.