Existe o vinho sem filtrar. Sim. É mais caro e perecível. Também está cheio de tropezones e tem uma cor mais turbio. Mas tudo não são colas. Conserva um intenso sabor a uva, como se não levasse álcool e fosse mais bem um mosto. Alguns o chamam vinho natural, outros aberración, ainda que a cada vez é mais habitual encontrar nos bares e adegas.
"Tem chegado para ficar, a gente agora procura novas experiências e o vinho sem filtrar desde depois a oferece", detalha o experiente Zoltan Nagy. Meritxell Falgueras, enóloga e comunicadora em Wine in the City, também defende seu recente sucesso. "Dantes a limpidez era importantíssima no exame visual, mas agora premiamos mais os aromas e o sabor na boca", acrescenta. O objectivo desta nova hornada de caldos é transformar as uvas em vinho da forma mais pura possível; não agregar nada, nem tirar nada. E ainda que isto soe lógico, para este sector é toda uma revolução porque o do supermercado pode chegar a conter até 88 aditivos.
O vinho sem filtrar não é vinho natural
"O vinho natural pode ser sem filtrar ou não", sublinha Josep Rabasa, produtor na adega o Batlliu de Sort situada no Pirineo catalão. Responder à pergunta de que é o vinho natural é complicado. Não há um consenso ao respeito e o debate sobre se o vinho pode se chamar natural gera discussões acendidas. De facto, a Federação Espanhola do Vinho (FEV) não quer molhar neste tema. "Não temos nada que dizer sobre isso; em realidade, não tocamos nada dos vinhos sem filtrar", assinala José Luis Benítez a Consumidor Global, presidente da FEV.
Rabassa arroja luz sobre o tema: "Como seu nome indica, este tipo de vinho não se filtra, não passa nem pela clarificación, nem pela filtragem". A clarificación e a filtragem são os últimos processos aos que se submete esta bebida. O primeiro serve para eliminar impurezas, e o segundo consiste em tirar todas as substâncias sólidas que fiquem. Daí que o vinho branco sem filtrar não seja transparente, sina mais bem anaranjado. No caso dos tintos, não há tanta diferença. "A cor é o mesmo e o tom da bebida já camufla as partículas que ficam", explica Nagy. Assim mesmo, o objectivo de não filtrar é "manter a esencia do campo, que o comensal quando o prove se teletransporte ao campo".
Está "mais vivo" e por isso caduca
A pergunta do milhão é: tem o vinho sem filtrar uma maior qualidade que o tradicional? "O conceito qualidade é muito ambiguo, porque o que eu valorizo, não apreciá-lo-á outro", contesta Rabassa. Nagy posiciona-se na mesma linha e acrescenta: "Varia muito segundo o elaborador e a qualidade da uva, não porque seja sem filtrar, é melhor".
O que sim que está claro é que tanta pureza implica que o vinho seja mais perecível, porque a filtragem ajuda à conservação da bebida. "O vinho sem filtrar está vivo, tem maior ónus de fermentos e bactérias", incide Nagy. Assim, este tipo de bebida é mais sensível ao passo do tempo e também às condições atmosféricas. "A um camião de vinho tradicional, se está um momento ao sol não lhe passa nada, mas a um sem filtrar, sim", alerta Rabasa. Matías Pérez, empregado do Celler Gelida de Barcelona, acrescenta: "Em nossa loja temos tido que retirar alguns dantes da venda, porque muitos não chegam nem a um ano de conservação"
Não apto para todas as adegas
Pérez faz questão de que tudo isto não é algo novo. Não obstante, até o momento poucas adegas tinham-se atrevido a vender o vinho sem filtrar. "Apresenta mais complicações quanto a produção, daí que não lhes interesse às maiores, porque não é tão rentável", assinala Rabassa. Ao não estar tão tratado é mais sensível às condições externas. "Requer a mais tempo, mais mimo e um maior detalhe", sublinha o produtor.
Ainda assim, como defende Nagy "o processo de elaboração do vinho está muito estudado, e a dia de hoje que não se filtre não implica que tenha algum risco". Isso sim, "eu sempre recomendo fixar na etiqueta, já que neste caso a informação que aparece na garrafa importa mais".
Vinhos sem sulfitos e vinhos veganos
A julgamento de Pérez, a moda do vinho sem filtrar assemelha-se muito à do vinho sem sulfitos, ou o vegano. Baseando em sua experiência como vendedor no Celler de Gelida, Pérez aponta que "pode que durante uns anos se tenha filtrado demasiado, já que se primou mais a estética ao sabor". Não obstante, para este experiente o segredo está em "não prescindir deste processo e fazer de uma maneira mais suave e não tão intrusiva".
Sobre os sulfitos, Pérez enfatiza e assinala: "Não há nenhum vinho sem sulfitos, porque o vinho em si já os tem. Deveria mudar-se mais bem por 'sem sulfitos acrescentados'". Assim mesmo, quanto aos veganos seu nome responde a que, quando se clarifica o vinho, se faz mediante claras de ovo, traças de pescado ou inclusive "cascas de bicho", acrescenta Pérez. Por isso, agora com o boom do veganismo, são muitas as adegas que têm procurado outros métodos de filtragem e, assim, poder pôr a etiqueta de vegano, que "vende muito", conclui Pérez.