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Médicos criticam as recomendações da Fundação para a Dieta Mediterrânica sobre o consumo de vinho
Algumas pirâmides nutricionais afirmam que a ingestão de dita bebida alcoólica "pode ter efeitos benéficos para a saúde", mas os especialistas discordam
A postura da OMS com face à ingestão de álcool não deixa lugar a dúvidas: "quanto menos, melhor". Ao mesmo tempo, um estudo do Ministério de Previdência determina que "não consumir álcool é o único que evita os seus efeitos prejudiciais". No entanto, a Fundação Dieta Mediterrânica ainda inclui o vinho na sua pirâmide nutricional e afirma que um consumo moderado desta bebida e durante as refeições "pode ter efeitos benéficos para a saúde". Uma afirmação com a qual médicos e nutricionistas levam as mãos à cabeça.
O álcool "não traz nenhum benefício para a saúde", diz a este meio o diretor do centro médico English Doutor Barcelona e especialista em alcoolismo, Steven Joseph Hunyi, que nos garante que, com base em provas científicas, nenhum profissional de saúde deve recomendar o consumo de álcool. Então, como é possível que o vinho continue presente na pirâmide nutricional da Fundação Dieta Mediterrânica, que diz fomentar um estilo de vida saudável?
É o vinho uma droga?
"Não estamos a favor de que o Governo de Espanha demonice o secor do vinho e inclusive diga que é uma droga", são as palavras que utilizou o presidente do Partido Popular, Pablo Casado, para defender o setor vitivinícola espanhol. Mas a verdade é que o vinho tem entre 10% e 16% de álcool. "E o álcool tal como o tabaco e outras substâncias, é tóxico e gera vício, pelo que é uma droga", aclara o bioquímico e divulgador científico em Laniakea, Óscar Huertas Rosales, cuja postura é partilhada pelo resto de especialistas consultados.
Além disso, as bebidas etílicas alteram a consciência e têm efeitos psicoativos. Cientificamente, "o álcool é uma droga", cocorda o psiquiatra especialista em vícios da Clínicas Cita e membro de Top Doctors, Josep Maria Fábregas, que explica que não se entende que o vinho apareça em pirâmides nutricionais de referência como a da Fundação Dieta Mediterrânica.
O conflito de interesses da Fundação Dieta Mediterrânica
Ao mergulhar no website desta fundação é fácil perceber por que a sua pirâmide, que é um dos guias alimentares que estão mais presentes no imaginário coletivo, inclui o consumo de vinho entre as suas recomendações. É que adegas tão importantes como Ramón Bilbao, Família Torres e Freixenet fazem parte do seu conselho de administração.
"Há um claríssimo conflito de interesse. Daí que se inclua uma bebida alcoólica numa recomendação de saúde, o que é absolutamente paradoxal com as provas científicas em mãos", denuncia a doutora em Ciência e tecnologia dos alimentos especializada em segurança alimentar, Beatriz Robles, que afirma que o problema é que muitos consumidores acham que são pirâmides de entidades oficiais quando na verdade trata-ae de "sociedades científicas com graves conflitos de interesse". Do mesmo modo, Huertas afirma que trata-se de um guia "obsoleto" e que é "incompreensível" que inclua o mito do copo de vinho diário.
Tomar um copo por dia: o mito que faz parte do passado
Desde há anos, tentou-se instaurar a crença de que um copo de vinho ou um consumo de cerveja moderado é saudável graças aos taninos e polifenóis, que são protetores cardíacos. "Com moderação e nas refeições, é saudável", diz da Coordenadora de Organizações de Agricultores e Ganadeiros (COAG), o responsável pelo setor vitivinícola, Joaquín Vizcaíno. Mas "este mito não se sustenta, desmontou-se e faz parte do passado", aponta Fábregas, que explica que o chá, entre outros alimentos, também contém taninos e polifenóis e é mais saudável. Neste sentido, os benefícios que possa ter o vinho "não compensam os possíveis danos que produz a toxicidade do álcool", insiste Huertas.
Ao mesmo tempo, enquanto alguns especialistas desmontam, uma vez mais, este mantra, o último relatório do Plano Europeu contra o Cancro afirma, entre outros pontos, que o consumo de álcool é um fator de risco de muitos tipos de cancro, pelo que baralha a possibilidade de estabelecer um rótulo semelhante ao do tabaco para as bebidas alcoólicas, entre elas o vinho. Esta iniciativa tem o sector vitivinícola em garra, embora isso significaria uma informação mais completa para os consumidores.
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