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Da terra à mesa: as práticas que multiplicam o preço dos alimentos

A diferença na margem dos produtos nos supermercados não é percebida pelos agricultores que passam a vida no campo

Alejandra Used

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O custo dos produtos agrícolas em Espanha multiplica-se na sua viagem da terra à mesa. Antes do Covid-19, o setor já enfrentava uma crise pela queda generalizada dos preços emnaorigem e, em consequência, dos seus rendimentos. "A diferença de margem é um problema e as subidas nos supermercados não chegam em absoluto ao campo", alerta Diego Justa, presidente da União de Pequenos Agricultores e Ganadeiros (UPA). Na verdade, o que o agricultor recebe não dá nem para cobrir as despesas de produção.

Por isso, o elo mais baixo da corrente luta para regularizar a situação. Estes profissionais assumiram os custos extra de aplicar todas as medidas sanitárias com o objetivo de não repassá-las ao preço final do produto. Máscaras, luvas, geles, PCRs ou duplicação de postos para cobrir baixas são algumas das ações que se levaram a cabo para fazer frente à crise do coronavirus. Trata-se de protocolos necessários, mas nada baratos que, nalguns casos, elevam as despesas até 30%.

Os custos e preços

A aplicação de todas as medidas necessárias significou para algumas cooperativas agrárias entre 35.000 euros e 100.000 euros de despesas adicionais, tal como indica a Fundação Talento que agrupa mais de 10.000 agricultores, empresas, cooperativas e explorações familiares. Enquanto isso, algumas redes de distribuição justificam as subidas de preço dos produtos nos custos higiênicos. "Estas empresas têm uma grande rentabilidade e, por isso, somos céticos", insiste, no entanto, o presidente de UPA.

Os agricultores queixam-se de que não são, na realidade, os donos do preço de suas colheitas. Na verdade, em fevereiro os produtores de alcachofra venderam cada quilo a 83 céntimos na origem, mas quando chegou ao destino final este valor aumentou e superou os três euros, segundo o último Índice de Preços em Origem e Destino dos alimentos elaborado pela Confederação de Organizações Agrícolas e Ganadeiros (COAG). A diferença, neste caso, foi de 277%. Mas há muitos exemplos semelhantes, como o da berinjela, a azeitona de mesa, o alho, a batata, os brócolos ou a laranja.

Regulação

Da mesma forma, uma má prática que ocorre neste setor-são as importações em massa, já que afundam o valor do produto nacional. "Costumam ir acompanhadas de um rótulo nada claro e pouco justo", alertam da UPA. No entanto, o setor não está na contramão destas ações comerciais, dado que 52% da produção agrária espanhola destina-se diretamente à exportação.

Mas para pôr fim às práticas desleais, o Conselho de Ministros aprovou um projecto de reforma da Lei da Corrente Alimentar do 2013 articulada pelo ministro Miguel Arias Cañete. Esta modificação tem como objectivo "dar maior transparência ao funcionamento da rede alimentar e à formação de preços, conseguir um equilíbrio em todos os elos --produtores, supermercados e indústria-- e proteger os mais fracis, isto é, ao agricultor e ao ganadeiro", segundo informou o ministro de Agricultura, Pesca e Alimentação, Luis Planas, em 2020. No entanto, esta mudança não entrará em vigor até novembro deste ano.

Plataformas para salvar intermediários

Diante da negligência deste modelo que dificulta um preço justo, começam a surgir plataformas com o fim de eliminar intermediários e reduzir os custos adicionais. Trata-se de iniciativas nas quais os pequenos agricultores e ganadeiros podem vender os seus produtos de maneira direta.

"O preço do produto é definido por eles e nenhuma superfície os marca . Nós não entramos nesse aspeto nem cobramos comissão", explica Mamen Camaño, responsável pelo site Mercado Local. Segundo os seus cálculos, "os custos chegam a elevar-se em torno de 50 céntimos o quilo quando se vêem obrigados a trazer o produto de fora". Por isso, procuram tornar-se numa alternativa que sirva de ajuda na hora de fomentar o consumo de proximidade. Nesse sentido, o Projecto Kulto é outra iniciativa que mostra aos utilizadores os agricultores locais mais próximos, os produtos que vendem e a possibilidade inclusive de ir à própria horta ou campo para recolher os alimentos e levá-los a casa.