Diz o ditado espanhol que comer a muitos mata e a dieta a muitos salva. Depois de anos de pesquisas criteriosas, a evidência científica começa a especificar o que a sabedoria popular e o sentido comum intuiram desde há muito tempo, isto é, que uma alimentação saudável é fundamental para a saúde. Tanto é assim, que a dieta mediterrânea, da qual Espanha é um dos principais países a nível mundial, se tem destacado como uma das estratégias melhor valorizadas pelos especialistas para prevenir o Alzheimer e outras doenças. Na verdade, estima-se que pode ajudar a evitar ou atrasar o desenvolvimento de um terço dos casos.
No entanto, a dieta de que tanto fazemos alarde parece estar a cair no esquecimento. "Deveríamos voltar a comer o mesmo que as gerações anteriores. Estamos a perder a dieta mediterrânea", afirma à Consumidor Global Aleix Sala, pesquisador especializado em dietética do Barcelonaßeta Brain Research Center (BBRC) e do Institut Hospital do Mar d'Investigacions Mèdiques (IMIM). Já a pastelaria industrial, os refrigerantes açucarados e os alimentos com muito sal, estão cada vez mais presentes nas mesas dos espanhóis, e são os principais assassinos do cérebro, segundo apontam os especialistas consultados por este meio.
Azeite, peixe azul, frutas cítricas e paixão pela laranja
"O que a dieta mediterrânea faz é cuidar das arterias. Ao cuidar das do cérebro, também se protegem os neurónios", resume José Ramón Lorenzo, vice-presidente da Sociedade Galega de Neurología. Nesse sentido, Vila explica que este tipo de alimentação é abundante em produtos de origem vegetal e gorduras saudáveis. Por isso, defende o consumo de azeite virgen extra e de sementes carregadas com antioxidantes, quer sejam legumes ou frutos secos. Além disso, sublinha a importância de incluir peixe nos hábitos de consumo: "Ao menos duas porções por semana". A razão é que contêm omega 3, detalha a este meio José Enrique Campillo, médico especialista em nutrição e catedrático de fisiología na Universidade de Extremadura.
Além disso, este especialista destaca as vitaminas antioxidantes como outro aliado poderoso para atrasar ou prevenir o aparecimento da doença, como as dos cítricos e o kiwi. "Mas nunca em sumo. Melhor a peça inteira ou triturada", esclarece. Também sublinha as propriedades da vitamina E, presente no abacate, por exemplo, e da vitamina D, que se pode encontrar nos ovos, entre outros produtos. Na mesma linha, este catedrático, autor do livro sobre nutrição e doenças O macaco obeso, recalça os benefícios antioxidantes de substâncias como os beta-carotenos, que abundam nas hortaliças e frutas de cores alaranjadas, como as cenouras e as mangas.
Veto à comida de churrasco
Entre os aliados para reduzir a incidência do Alzheimer também figuram os polifenóis, um grupo de substâncias que se encontram, por exemplo, na uva tinta e, por isso, no vinho tinto. Para desilusão de muitos, a verdade é que o álcool não é recomendável para a prevenção da doença, pelo que a moderação é chave. Pese a isso, outra forma de os introduzir na dieta é através das abrunhos, framboesas, medronhos, groselhas ou amoras. "É bom tê-las sempre à mão e comer um punhado após almoçar/jantar", assinala Campillo, que agrega ao catálogo de produtos com esta substância o chá verde e a cúrcuma. Em relação a esta última, o vice-presidente da Sociedade Galega de Neurología discorda e assinala que o seu benefício para prevenir o Alzheimer se "está a pesquisar muito e que, por agora, os estudos estão a sair inconclusivos".
Outro dos aspetos que o catedrático destaca é a cozinha saudável dos alimentos. "Há que evitar as temperaturas demasiado elevadas. Por exemplo, nos churrascos ou quando se faz as torradas se produzem umas substâncias perigosas e tóxicas para o cérebro que não se eliminam com facilidade e que têm efeitos acumulativos", afirma.
Em guerra com os ultraprocessados, o sal e o açúcar
Alinhado aos hábitos que se deve evitar, Aleix Sala destaca a necessidade de vigiar a quantidade de alimentos ultraprocessados que se consomem e também preconiza a redução de gorduras animais, o sal e os açúcares. Isto é, as mesmas recomendações que qualquer médico poderia fazer a um paciente para reduzir o risco de sofrer um infarte. Na verdade, as doenças cardiovasculares e o Alzheimer andam de mãos dadas e as pessoas que sofreram um derrame correm maior risco. "Cuidar da componente vascular é fundamental; a tensão, o colesterol, os triglicéridos, o açúcar… isto é o que faz com que possa aparecer antes. Favorecem que se acelere o processo de morte neuronal e por isso é importante cuidar da alimentação com rigor", concorda por sua vez Lorenzo, da Sociedade Galega de Neurología. Assim, os refrigerantes açucarados, a pastelaria industrial e os alimentos com muito sal se convertem em autênticos assassinos de neurónios.
Apesar de todas as recomendações que se possam fazer, a verdade é que o Alzheimer é, de alguma forma, uma lotaria que pode tocar a qualquer um, quer se cuide ou não, ainda que os segundos têm mais probabilidades. No entanto, os especialistas consultados pela Consumidor Global concordam em que, no pior dos casos, uma boa alimentação também pode fazer com que se atrase o desenvolvimento da doença. "É muito difícil que só com uma mudança de dieta se reduza a zero o risco da padecer, mas, além do benefício individual de atrasar o processo, há que ter em conta o benefício económico que tem para a sociedade devido ao nível de custos que implica para o sistema", sublinha Sala.
A dieta MIND, uma variante da mediterrânea
Para muitos, seguir as recomendações do médico supõe um suplicio devido à eliminação de certos hábitos que, ainda que agradáveis, são pouco saudáveis. Ante esta situação, uma epidemiologista da Universidade de Rush (Estados Unidos) desenvolveu a denominada dieta MIND --mente, em inglês--, que é uma mistura da mediterrânea e outra para conter a hipertensão.
Esta dieta propõe, no mínimo, três porções de cereais integrais, uma salada e outras verduras todos os dias, além de um copo de vinho com uma das comidas principais. Também recomenda comer frutos secos em dias alternados e comer frango e frutas vermelhas pelo menos duas vezes por semana. Se essas diretrizes forem seguidas, segundo os estudos desta universidade norte-americana, o risco de de sofrer de Alzheimer é reduzido para 53% nas pessoas que a seguem drigorosamente e até 35% com um cumprimento moderado.
Divertir-se também é importante
Segundo os estudos realizados em Espanha, calcula-se que umas 700.000 pessoas com mais de quarenta anos sofrem de Alzheimer e sestima-se que em 2050 "o número de doentes terá duplicado e aproximar-s-á dos dois milhões de pessoas". Para o mesmo ano, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que terá 132 milhões de afetados em todo o planeta, isto é, o equivalente à população atual de México. Além disso, esta doença degenerativa até hoje continua a serum mistério em muitos sentidos. "Não se sabe quando começa e os sintomas aparecem quando já se desenvolveu", explica Lorenzo.
A idade, o sexo --as mulheres são mais propensas-- e a genética são os fatores principais sobre os quais não se pode incidir para prevenir a doença. No entanto, além da alimentação, fazer exercício e evitar o consumo de tóxicos --como o fumo, o álcool e as drogas-- são aspetos nos quais sim se pode ctuar de forma individual. "Divertir-se, ler, sair a passear e relacionar com outras pessoas são aspetos quase tão importantes como a dieta para conseguir que os neurónios continuem a funcionar bem", conclui o neurologista.