Nas grandes urbes, contaminadas e cheias de carros, começaram a aparecer pequenos pontos verdes. Estas hortas criam uma pequena comunidade, de jovens e seniores, em torno da agricultura e o trabalho da terra. No entanto, usá-los como uma fonte de alimentação, tal como se fazia no passado, resulta hoje em dia mais como uma utopia que uma possível alternativa.
Pode uma família abastecer-se de uma horta urbana? Diante de tal pergunta há que ter em conta, sobretudo, que o espaço e as condições são duas das maiores barreiras. A qualidade do ar e a quantidade de água não são os mesmos no centro de uma cidade que num ambiente rural. Além disso, o espaço para produzir hortaliças reduz-se em favor de pequenas parcelas. "Em cidades como Havana, as hortas comunitárias representam 40% do consumo de legumes frescos. Isto é, o modelo é viável, mas na nossa concepção de grandes cidades é difícil de introduzir nos dia de hoje", explica à Consumidor Global Julián Briz, catedrático de engenharia agronómica na Universidade Politécnica de Madrid.
Mudança de costumes
As dificuldades começam pelos próprios hábitos de consumo. O ritmo de trabalho e lazer nas urbes é acelerado, com uma alimentação cada vez mais preparada. "Se hoje em dia já é complicado organizarmo-nos para comer produtos ecológicos ou de proximidade, trabalhá-los você mesmo é um esforço ainda maior" assinala Andrea Estrela, membro da cooperativa Germinando, uma consultoria de iniciativas socioambientais.
Também se deve ter em conta a rotação e sazanolidade dos cultivos. Segundo conta Estrela, uma horta produtiva teria que ter espaço e disponibilidade para cultivos que dessem fruto todo o ano, situação complicada nas condições da maioria das hortas urbanas. E outros legumes com maior durabilidade, como batatas, cebolas ou alhos, requerem uma enorme quantidade de terreno para gerar uma produção suficiente.
As matemáticas da terra
Alguns estudos mostram-se otimistas com a capacidade deste tipo de hortas. "Uma parcela de um metro quadrado pode dar, no máximo, 6,7 quilos de hortaliças anuais, ainda que a média se situa entre os três e cinco quilos", indica Raúl Ponte, doutor em geografia pela universidade Pablo de Olavide em Sevilha."Segundo o Ministério de Agricultura, Pesca e Alimentação, uma pessoa consome em Espanha, em média, 94,68 quilos de verduras por ano. Neste sentido, Ponte estima que, se uma família de três membros precisa esta quantidade, representaria um total de 284 quilos anuais. Pelo que com uma parcela de 50 metros quadrados poder-se-ia conseguir, de forma óptima, uns 335 quilos de hortaliças, suficiente para alimentar uma família durante um ano.
Infelizmente, estas dimensões afastam-se do espaço de cultivo da maioria das hortas urbanas que há nas grandes cidades. Mas em pequenas e inclusive em cultivos periurbanos, aquelas localizadas nas periferias, costumam oferecer 25 ou 50 metros quadrados como padrão . "A realidade, no entanto, é mais complicada. Nem todas as famílias consomem o mesmo, nem toda a terra são iguais. Além disso, também afeta o tempo disponível para trabalhar a horta ou a motivação e experiência de cada um", enfatiza este especialista.
O modelo dos nossos avôs
O tipo de cultivo também é um factor fundamental para saber quanto pode produzir uma horta urbana, já que cada semente tem tempos muito concretos para ser semeada e recolher os seus frutos. "O mais importante é saber o que plantar e quando o fazer para poder comer vegetais todo o ano. A minha família e eu, somos quatro pessoas, baseamos cerca de 70% da nossa alimentação no que produzimos e mal trabalhamos com uma parcela de 50 metros quadrados", conta David Lagares, cofundador da Huertoteca, uma empresa madrilena dedicada a dar cursos de horticultura e desenhar hortas urbanas.
Para Lagares o problema é pensar numa horta como se fosse um enorme supermercado. O monocultivo, sublinha, centra-se em ocupar-se só de um número concreto de verduras, favorecendo a qualidade e a produção. "Cada zona de Espanha tem umas verduras e árvores que se cultivaram durante gerações e que, portanto, estão acostumados a uma climatología específica, com seus próprios ritmos. Se conhecermos bem estas hortaliças autóctonas é mais fácil manter a sua conservação e um crescimento óptimo", conclui este empresário.