A invasão dos supermercados obrigou ao talho Cal Carré, depois de seis décadas num central local de Terrassa, a baixar a persiana para sempre. Era 2016.
Quatro anos depois, "meus pais faleceram e minha irmã encontrava-se num estado muito avançado de sua doença. Foi então quando propus em casa: 'Por que em lugar de fazer libritos de lombo não começamos a fazer livros de autores clássicos?'. E a minha irmã brilharam-lhe os olhos", relata Antònia Carré-Pons, escritora e diretora da editorial que leva o apellido de sua família.
Cal Carré: de talho a editorial
"Durante a pandemia tivemos tempo de rumiar -prossegue a editora-, e ocorreu-se-nos transformar o selo do talho familiar numa editorial como homenagem aos que já não estavam".
Cal Carré subiu a persiana reconvertida em editorial em 2021 com o convencimiento de que o alimento do alma é tão importante como o do corpo.
Libritos de autores clássicos
De Stendhal a Dostoyevski, passando por Woolf, Austen, Tolstói, Pushkin e Cheever, entre outros. "Por um tema de custos, tínhamos claro que não podíamos publicar a autores contemporâneos e a opção dos clássicos tomou força", expõe Carré.
Assim, com suas colecções Menuts, Llibrets e Llom a duas colors, porque todo tem que ver com o porco e as origens do negócio familiar, acercam os clássicos ao público generalista catalão. "São clássicos modernos. Falam de temas absolutamente atuais", recalca a editora.
'Best-sellers'
Os livros editados por Cal Carré em catalão podem-se encontrar nas estanterías das principais livrarias de Barcelona: A Central, Laie, Documenta, Casa Usher, Ona…
A obra Lucy Gayheart, de Willa Cather e traduzida por Núria Sales, "é um dos livros que melhor funcionou em 2024, mas a novela Pobres, de Fiódor Dostoyevski e com tradução de Miquel Cabal, é nosso best-seller", aponta Antònia Carré-Pons.
Novidades editoriais de 2025
Existe uma barreira entre numerosos leitores e as obras mais extensas de Dostoyevski, por isso Cal Carré tem publicado O senyor Prokhartxin, dois contos (144 páginas) do grande autor russo que "abrem caminho e permitem a todo mundo se acercar aos clássicos sem medo".
Este 2025 "publicaremos duas maravilhas". A mort de Virginia, de Leonard Woolf e traduzido por Marta Pera, uma crónica muito emotiva dos anos de entreguerras escrita pelo marido da escritora. E Vi de solitud, de Irène Némirovsky e com tradução de Anna Casassas, uma obra subversiva e autobiográfica sobre o destino de uma família russa refugiada em Paris depois da Revolução de 1917.
Passado, presente e futuro
"Os livros vão-se vendendo bastante bem e a editorial tem futuro", assegura Antònia Carré-Pons, quem recorda com nostalgia no ano 2020.
"Acompanhar a uma pessoa nos últimos momentos de sua vida é uma experiência muito dolorosa. Minha irmã faleceu aquele novembro e não pôde ver a nova editorial em funcionamento, mas a simples ideia da editorial fez que quando nos encontrávamos ali, na parte posterior do antigo talho familiar, pudéssemos falar de algo que tinha futuro num momento no que ela não o tinha, e a família se voltou a unir ao redor do novo projecto de Cal Carré".