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Yassir Raïs, fundador de Syra Coffee: "As cápsulas de café são um cancro"

Entrevistamos ao empresário catalão que dirige quarenta cafeterias, acaba de publicar um livro e tem sido incluído na lista dos 30 jovens mais influentes de Espanha

Teo Camino

El fundador de Syra Coffee, Yassir Raïs, en la redacción de Consumidor Global LUIS MIGUEL AÑÓN

Nas embalagens de seu café não há reclamos, senão dados. Uns dados que falam do produtor, da procedência do grão, da prova e do tueste, da sustentabilidade do produto, mas sem escrever a palavra sustentável. Se sobreentiende. Porque o café de especialidad é justamente isso, um produto cultivado em harmonia social e meio ambiental, e Syra Coffee é seu máximo expoente em Espanha.

A corrente Syra Coffee tem quarenta cafeterias repartidas entre Madri, Valencia, Sevilla, Donostia, Málaga, Girona e Bilbao, e o maior tostador de café de especialidad da península. A missão de seu fundador, Yassir Raïs, não é outra que a de acercar o café de especialidad a todos paladares, e vai por bom caminho: acaba de publicar o livro Da finca à xícara (Editorial Cincotintas, 2024) e Forbes incluiu-lhe em sua lista dos 30 jovens mais influentes de Espanha.

--A que idade provou o café?

--Bastante tarde. Aos 16 ou 17 anos. É uma lembrança unida ao ficar-me acordado até tarde para estudar o bachillerato.

--Recorda o primeiro sorbo?

--A verdade é que não. Teria que poetizar demasiado e seria mentira.

--Em 2015 abriu uma pequena cafeteria de vinte metros quadrados no bairro de Gràcia…

--No verão de 2015 encontrei um pequeno local na rua Siracusa, que era uma rua na que só tinha uma oficina mecânica, e me lancei com uma ideia intuitiva. Em dez dias fizemos as obras, eu era o operário, e abrimos. Teve bastante sucesso, tinha bicha a cada dia, e ao acabar a carreira de arquitectura, em 2018, expandimos-nos a Poble Sec, Passeig Sant Joan…

O local de Syra Coffee na rua Siracusa de Gràcia, o primeiro dos quarenta que tem aberto a corrente / CEDIDA

--E assim até as quarenta cafeterias que geris na actualidade…

--O plano é seguir crescendo e chegar a mais cem locais nos próximos dois anos.

--Cem locais de café de especialidad, em que se diferencia de um industrial?

--No paladar. Um café de especialidad é, a maioria das vezes, doce, porque o café é uma fruta. As diferenças principais encontramo-las no cheiro e no sabor. Ao café de especialidad não é necessário lhe pôr açúcar porque encontrarás essa doçura e acidez de base. Não assim a amargura do café industrial. Ademais, o café comercial paga-se ao produtor a 360 dias vista, quando o humano é o contacto com a finca e pagar um preço justo ao produtor. Nós pagamos ao produtor quando compramos o café, assim o benefício é mútuo. Isto é bem mais sustentável que uma pajita de milho.

--Se o segredo de uma boa pizza está na massa, onde está o do café?

--Fazendo o símil com a massa, é importante o forno, o tomate, o tueste, a preparação, mas o segredo está na matéria prima, numa boa origem.

--Syra Coffee trabalha com 70 produtores de África e América do Sul e tem sua própria planta de tueste em Barcelona… Como funciona?

--Da finca à xícara, um das eslabões mais importantes é o tueste, onde o café verde passa a ser tostado. Precisamos esse espaço para alojar o café de nossos produtores e ali temos uma tostadora imensa. A central de tueste de Hospitalet de Llobregat serve a todas as cafeterias Syra.

O novo livro de Yassir Raïs, 'Da finca à xícara', junto a um café / SYRA COFFEE

--Deve de ser uma maravilha olfativa entrar ali a cada amanhã…

--Deve de sê-lo, mas eu quase não o cheiro já. Estou como inhibido, é como o perfume que te pões a cada dia, que o deixas de cheirar.

--Se alguém prova um café de especialidad, resultar-lhe-á impossível voltar às cápsulas?

--A gente acha que para fazer-te um café de especialidad em casa precisas uma cafeteria cara, mas é falso, podes fazê-lo com uma cafetera italiana de toda a vida e sacarás um cafetazo. Se tens uma máquina de cápsulas e não sabes onde a meter, passa ao café de especialidad. Aposta pelo artesanato.

--Como se pode cuidar a cada passo da corrente de fornecimento, assegurando a qualidade, transparência e traçabilidade desde a finca até a xícara?

--O primeiro é a relação com o produtor, essa cercania, o trato direto. A transparência com o crescimento da planta sem pesticidas ou como se paga aos empregados também é fundamental. Nós compramos cafés de temporada que passam por uma importação, em barco, e depois começa o tueste. O café de Syra nunca se sobretuesta, tem que ser um café fresco, repousado, e os sirvo exactamente duas semanas após o tueste.

--O café de especialidad pode competir com o café comercial produzido em massa?

--O café de especialidad representa o 2% do café que se move no mundo, e com o 2% não se pode competir. Nosso objectivo é concienciar à gente. Temos que lhe tirar o aspecto elitista ao café de especialidad, e isso passa por conseguir preços acessíveis. Assim, pouco a pouco, convenceremos a cada vez a mais paladares. Queremos convencer às massas, e o crescimento é imprescindível para a sustentabilidade, mas é demasiado ambicioso dizer que vamos competir com o café industrial.

--Alonso Galofré, dA Perfumaria Coffee, disse numa entrevista para Consumidor Global que "as cápsulas se têm de proibir já". Que opina?

--Eu não sou tão radical, porque pode ter consequências no mercado, mas as cápsulas de café, como as conhecemos hoje em dia, são um cancro. Ainda que está a ver-se um avanço relevante para as cápsulas compostables. A cafetera de cápsulas tem permitido chegar a ter uma cafetera em casa. Agora toca pensar como essas cápsulas de metal têm de ir para outros modelos, porque existem soluções de cápsulas 100% compostables.

--As cápsulas compostables ainda não são muito habituais nos supermercados…

--Não, mas se começam a ver.

--São mais caras?

--Quando entra um produto novo, sempre é mais caro. Mas o avanço já está aqui. A gente não o sabe, mas o café de cápsula, por grama, é extremamente mais caro. Uma cápsula contém entre 4 e 6 gramas de café, pelo que o quilo te sai a 70 ou 80 euros. Enquanto num café de especialidad sai-te a 20-30 euros o quilo.

--Acaba de apresentar seu livro 'Da Finca à Xícara' em sua nova cafeteria da rua Bruc e ao mesmo tempo incluíram-lhe na última edição da lista Forbes 30 under 30. Como se sente?

--Está a ser um bom ano. Como me sento? Sento-me bem. Sento que ajuda muito que nos façam estes reconhecimentos. A lista, a editorial… Faz-me muita ilusão, não mo esperava.

--Qual é a mensagem de seu novo livro, 'Da finca à xícara' (Editorial Cincotintas, 2024)?

--A homenagem que fazemos à cada finca na cada café que servimos em Syra.